Por Ana Paula Barcellos
Londrina faz aniversário. Sou cria dela, um clichê Pé Vermelho. Como boa parte das pessoas da minha geração que nasceram por aqui, sou neta/bisneta de pioneiros e pioneiras. Da família dos Lourenço, aqueles da verdadeira primeira olaria da cidade.
Meus bisavós moldaram as primeiras telhas que cobririam casas de Londrina e região e, embora a história oficial teime em contar outra versão e omitir os feitos de gente do povo que construiu esse chão, essa cidade também é nossa.
Eles também co-fundaram o Parque São Lourenço e a Vila Portuguesa. Não é chique, né? Mas é nosso legado.

Meus bisavós, um casal de portugueses crica que não gostava de gente, mas se amava muito e amava Londrina, construíram uma casa conhecida na antiga Marechal Deodoro, onde faleceram com uma diferença de 4 dias – um morreu primeiro e o outro morreu de tristeza. A casa tinha histórias terríveis e ficou um tanto abandonada. Acabou demolida, como costuma acontecer com as casas pioneiras por aqui.
Essa é minha cidade. Cresci correndo nas praças do Centro, onde era comum as crianças brincarem até 21h da noite! Fiz piquenique no Bosque, no Parque Arthur Thomas, acampei na Mata dos Godoy; Calçadão sempre foi meu quintal e, desde pequena, a primeira coisa que eu faço é abrir a janela pra ver como está o céu mais bonito do mundo.

Como sobrinha de corretores de imóveis (minhas tias foram da leva de primeiras mulheres corretoras da região), vi Londrina crescer e passei minha adolescência percorrendo cada canto da cidade, acompanhando a fundação de loteamentos que hoje são bairros inteiros: “Aqui agora não tem nada, né? Mas você precisa imaginar daqui 15, 20 anos”, dizia tia Lúcia.
Sou mesmo o clichê londrinense – só odeio a mania de forçar barra pra forjar ligação com Londres! Mas adoro nossas raízes, adoro que elas sejam sertanejas – sou neta e bisneta de gente do campo, da roça, de comerciantes; gente comum que lutou pra construir uma cidade de oportunidades para si e para as gerações seguintes.
Por isso também brigo tanto “com” Londrina! Porque essa cidade pode ser tudo e tem gente insistindo pra ela não ser. Mas também, mal da minha cidade só falo eu!
Mais um aniversário
Pensava sobre isso tudo ontem, enquanto passava pelo centro histórico, olhando as ladeiras que eu adorava subir quando era criança; as lojas que ainda guardam lembranças de outras décadas, os hotéis que pararam no tempo; vim subindo e me lembrei do sorvete italiano da frente do Bosque… da empolgação de pegar livros novos na Biblioteca Infantil!
No cruzamento, o ex-prefeito simpático em quem já votei atravessa a rua, alheio e anônimo. Os pombos estão agitados, vem chuva! Olho pra cima e vejo os tons mais lindos de cinza e cinza pérola nas nuvens amontoadas, fazendo contraste com o verde incomparável das copas das árvores da Avenida São Paulo. Chego em frente ao meu prédio e as nuvens chovem todas em mim, numa pancada só. Olho para o seu Mauro e a gente cai na risada. Meus melhores banhos de chuva, propositais ou acidentais, também foram aqui.

Te amo, Londrina! Viva você, viva nós. Que juntas sejamos tudo aquilo que a gente pode ser, minha jovem-velhinha adorada.
Foto principal: Acervo pessoal

Ana Paula Barcellos
É graduada em História pela UEL, Mestre em Estudos Literários, integra coletivos culturais da cidade e é agente cultural. Sacoleira e brecholenta, trabalha com criação de joias artesanais e pesquisa de tendências, e escreve também a coluna de Moda deste jornal. Siga os Instagram @experienciasdecabide e yopaulab
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