Por Ana Paula Barcelos
Depois de 6 anos morando em casa térrea de bairro, acho que vou levar um bom tempo para me acostumar com o apartamento no Centro. Oli diz que os apartamentos têm um “quê” de aconchego, mas eu me sinto meio aprisionada. Porque, além do pouco espaço, falta céu na vista da janela.
Tem prédio demais ao redor. O Cemitério São Pedro é um refresco para os olhos que só veem janelas e sacadas. Dá até para cumprimentar os vizinhos do prédio que faz fundo com o meu, e bater um papo, de tão próximo! É prédio demais e perto demais.
Esse problema é maior no Centro, mas não é só do Centro. Já faz tempo que nossa cidade é vítima do fenômeno da verticalização excessiva. Essa prática, que envolve a construção de cada vez mais prédios, e prédios cada vez mais altos, compromete a qualidade de vida dos moradores e a infraestrutura urbana.
Isso porque prédios altos podem obstruir a luz natural, criar grandes sombras em áreas que antes eram ensolaradas, diminuir o acesso à luz e ventilação natural (os apartamentos vão ficando cada vez mais escuros, frios e abafados). O resultado é um ambiente urbano menos saudável. E, claro, espaços públicos, que deveriam ser locais de convívio e lazer, muitas vezes são deixados de lado em favor do desenvolvimento imobiliário, tornando a cidade mais fria e com menos convívio entre seus habitantes.
Uma cidade lotada de prédios não é sustentável
É preciso pensar também na questão da sustentabilidade. A construção de edifícios altos, sem planejamento adequado, pode levar a um aumento significativo na impermeabilização do solo. Isso dificulta a absorção da água da chuva, contribuindo para alagamentos e problemas de drenagem – o que já acontece em Londrina, né? Além disso, a verticalização sem controle pode afetar a biodiversidade local, especialmente em áreas onde a vegetação nativa é desmatada para dar espaço a novas construções. Aqui pode não parecer, mas a interação com a natureza é parte importante da vida urbana, o impacto pode ser grande e muito negativo.
E tem outro aspecto que costuma ser levado ainda menos em consideração, mas é fundamental: a tendência é que a verticalização gere desconexão entre os moradores e a cultura local. Com o surgimento de condomínios fechados e prédios de luxo, a cidade começa a se dividir em zonas isoladas, onde os moradores têm pouco contato com a diversidade social. Essa segregação espacial e social pode levar a um empobrecimento da cultura urbana, à medida que a vivência comunitária se torna cada vez mais rara.
Um fator que contribui para a verticalização excessiva é a especulação imobiliária. Com o aumento da demanda por imóveis em áreas centrais ou elitizadas, desenvolvedores buscam aumentar seus lucros, resultando em projetos que priorizam a quantidade em detrimento da qualidade. Isso cria um ciclo vicioso em que regiões inteiras se transformam em meros espaços habitacionais, sem considerações adequadas para a vivência e a convivência dos cidadãos.
Isso tudo, claro, só vai mudar ou deixar de acontecer quando o poder público implementar políticas urbanas que valorizem o desenvolvimento sustentável e equilibrado. O planejamento urbano deve considerar não apenas o aumento da oferta de habitação, mas também a preservação dos espaços públicos, a melhoria da infraestrutura existente e a integração dos moradores na vida comunitária.
Enquanto isso é apenas sonho distante e a gente sofre com os efeitos desse excesso e descontrole ambiente, vou buscando uma vida mais fora de casa e outras vistas. Espero ansiosa o dia em que olhar pela janela seja novamente motivo de alegria e relaxamento.
Foto principal: portal Gov.br
Ana Paula Barcellos
É graduada em História pela UEL, Mestre em Estudos Literários, integra coletivos culturais da cidade e é agente cultural. Sacoleira e brecholenta, trabalha com criação de joias artesanais e pesquisa de tendências, e escreve também a coluna de Moda deste jornal. Siga os Instagram @experienciasdecabide e yopaulab
(*) O conteúdo das colunas não reflete, necessariamente, a opinião do O LONDRINENSE.