Por Edmilson Palermo Soares
Em 24 de maio de 1976, o britânico Steven Spurrier (falecido em 2021), na época um lojista de vinhos, promoveu um evento para comemorar o Bicentenário da Independência dos Estados Unidos.
Convocou nove consagrados críticos franceses para uma degustação como uma grande brincadeira. Alguns grandes vinhos da França seriam avaliados, às cegas, lado a lado com desconhecidos californianos em um hotel em Paris.
Ele sabia que os vinhos da Califórnia estavam começando a despontar, mas ainda não eram páreos para os que vinham do “sagrado terroir francês”. Afinal, a França era a terra dos melhores vinhos do mundo, sem contestação.
Foram selecionados 20 vinhos, 10 brancos e 10 tintos, divididos igualitariamente entre franceses e norte-americanos. As uvas escolhidas foram o Chardonnay (branco) e Cabernet Sauvignon (tinto).
Spurrier declarou a um Jornal na época: “Planejei a degustação para chamar a atenção para a qualidade do vinho californiano. Ficarei feliz com um segundo e quarto lugares”.
O que aconteceu neste dia iria mudar o mundo do vinho para sempre.
Os brancos, todos Chardonnay, foram servidos primeiro.
O jornalista George M. Taber era o único presente à degustação.
Ele relata a cena que se seguiu: “Rapidamente percebi que eles (degustadores) estavam ficando confusos. Os juízes de um lado da mesa diziam ter certeza de que tinham provado um vinho francês, enquanto o outro lado jurava que o vinho em questão vinha da Califórnia”.

Para a surpresa de todos, o Château Montelena, produzido na Califórnia, foi o vencedor dentro da categoria.
Assim que começou a prova dos tintos, os ânimos dos avaliadores estavam exaltados, pois eles não queriam se enganar novamente e dar outra vitória para os norte-americanos. Seria vergonhoso para a França.
Assim, findada a prova dos tintos e novamente o primeiro lugar para os californianos, com o Stag’s Leap.
Alguns jurados se angustiaram com o resultado e pediram suas anotações de volta.
O jornalista George M. Taber comentou em seu artigo: “Se não houvesse um jornalista na degustação seria muito fácil para qualquer um negar que aquilo de fato ocorreu, ou que ocorreu de outra maneira”.
O julgamento repercutiu mundialmente
A repercussão foi imediata. Nos Estados Unidos, os vinhos californianos que participaram do evento esgotaram-se em questão de minutos.
Spurrier declarou na época: “Não esperava que o resultado do Julgamento fosse tão importante, mas ele se mostrou um divisor de águas na história do vinho”.
A partir deste evento, os consumidores passaram a olhar os vinhos de outros lugares do mundo, especialmente de fora da Europa, com outros olhos.
Os vinicultores diziam que, se a Califórnia conseguia produzir vinhos de qualidade superior aos da França, então eles também poderiam, desde que adotassem procedimentos similares aos dos dois países.
O Julgamento abriu os olhos dos produtores europeus. Todas as grandes companhias internacionais passaram a olhar para o mundo todo como sendo um grande campo para se plantar.
Desde então, é consenso que não é mais necessário que um vinho venha da França para estar entre os melhores do planeta, sendo possível encontrar ótimos rótulos espalhados pelo mundo.
Taber, tempos depois, declarou: “Acredito que esse evento tenha sido benéfico para todo o mundo do vinho. Ele pode ter enfraquecido o mito dos vinhos franceses e tê-los tirado de seu trono, mas, ao mesmo tempo, trouxe mais consumidores para esse mundo, fato que beneficiou a todos, inclusive os franceses”.
Em Napa Valley, local onde foram desenvolvidos os vinhos degustados no Paris, as vinícolas mais do que dobraram em números: passaram de 67 para mais de 400 vinícolas.
Este episódio nos mostra que um bom vinho não são apenas aqueles famosos, que tem um bom marketing, ou os mais conhecidos. Existem muitos bons vinhos que podem ser experimentados.
Vamos lá? Vamos experimentar alguns?
Se ficou curioso sobre este assunto, existe um filme que está na “Amazon Prime Video” desenvolvido em 2009, com a duração de 1h50min. No elenco temos: Chris Pine, Alan Rickman e Bill Pullman.
Então não esqueça de compartilhar essa história com aqueles amigos que gostam de conhecer mais sobre a cultura dos vinhos!
Foto principal: O vinho tinto que derrotou os franceses. Reprodução da internet
Edmilson Palermo Soares


Enófilo, sócio proprietário da Confraria da Taverna, loja de vinhos e espumantes que traz novas experiências no mundo do vinho, estudioso e entusiasta, com conhecimento prático provando vinhos de mais de 20 países e diversas uvas desconhecidas do público em geral. Me siga nas redes sociais: no Instagram @contaverna, Facebook Confraria da Taverna e Linkedin
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