Por Ana Paula Barcellos
Nos últimos tempos, uma nova tendência tem dominado as redes sociais e as passarelas: a estética “clean girl”. Esta proposta de estilo é marcada por um visual minimalista, caracterizado por peças em tons neutros, maquiagem sutil e cabelos ultralivres de frizz, frequentemente presos em coques ou deixados perfeitamente alisados. Embora essa estética possa parecer inofensiva à primeira vista, uma análise mais profunda revela que ela não apenas reflete um ideal de beleza, mas também se alinha com uma onda conservadora crescente em várias partes do mundo.


A “clean girl” preconiza beleza e simplicidade, oferecendo uma espécie de atalho estético que promete promover uma imagem de frescor e pureza. Essa uniformidade visual, no entanto, tem suas desvantagens. O uso incessante de roupas em tons beges e outras paletas discretas, juntamente com acessórios delicados, acaba por criar um cenário em que muitas mulheres se veem presas a uma mesma “cara”. Não é raro cruzar com multidões de jovens que, não por acaso, se parecem quase idênticas: cabelo bem arrumado, maquiagem leve, e um guarda-roupa que mais parece uma cópia da estética proposta nas redes sociais.

Por trás dessa tendência, há uma superficialidade que rapidamente se torna palpável. Ao priorizar uma aparência “clean” e homogeneizada, a individualidade é sacrificada em nome de uma norma estética que não questiona, não provoca, e que, de certa forma, ignora a pluralidade que caracteriza a beleza. Meninas de diferentes etnias, biotipos e estilos de vida, acabaram se aprisionando em uma bolha estética que sugere que existe apenas um jeito aceitável de ser bonita e interessante.
Padronização e tradicionalismo definem a estética clean
Além disso, essa uniformidade pode ser inquietante por sua relação com uma mentalidade conservadora que vem ganhando espaço em diversas sociedades. A tendência “clean girl” ecoa um ideal de comportamento que remete a valores tradicionalistas, onde a simplicidade e a contenção se tornam sinônimo de elegância. Embora a estética “clean” por si só não seja intrinsecamente negativa, ela se torna problemática quando se entrelaça com um discurso mais amplo que busca padronizar comportamentos e aparências sob a premissa de um conservadorismo romântico e nostálgico (sabem as trad wifes? Pois é).

É triste constatar que essa esteticização do cotidiano nos remete a uma sociedade que parece cada vez mais relutante em celebrar a diversidade. A recente valorização da autenticidade, da exuberância e da individualidade entra em conflito com a pressão social por um ideal que é, no fundo, vazio. O que se vê é uma geração que, em sua busca por pertencimento, acaba se conformando a um molde que limita a expressão pessoal.
Pra mim, essa estética apresenta o que existe de mais triste e não conversa nada com nossas raízes, nossa cultura. Somos brasileiras, sul-americanas, latino-americanas! Ninguém fala alto gesticulando porque o bisavô que nunca viu na vida era italiano; essa é uma característica brasileira, somos extrovertidos e naturalmente maximalistas!

Como brasileira, latina, consciente de minhas raízes e do quanto minhas referências estão ligadas à nossa terra e ao nosso povo, recuso essa estética higiênista e insípida. Eu quero progresso e evolução, não quero romantizar tradições que precisam permanecer onde estão, no passado.
E eu amo tons neutros, mas uso com meus cabelos esvoaçantes e frizados; acrescentou toques de cor, acessórios estilosos e diferentões. Quero ser eu mesma, e isso significa não querer ser mais uma na multidão que fala baixo e acena.
Foto principal: Freepik
Ana Paula Barcellos

Viciada em botas, sacoleira e brecholenta, trabalha com criação de joias artesanais e pesquisa de tendências. Tem foto da Suzy Menkes na estante e escreve essa coluna usando pijama velho, deitada no sofá enquanto toma café com chocolate. Me siga no Instagram Me siga no Instagram @experienciasdecabide e @yopaulab
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