Por Ana Paula Barcellos
Três meses morando em frente no Centro e quase nunca me lembro de ir à feira, logo eu, que amo feiras! Nesse último domingo, retomei o ritual esquecido: banho, café, roupa confortável de passeio e escolha da ecobag.
Antes mesmo de sair pelo portão, dou de cara com o mercado improvisado da rua, patchwork de lonas, quebra-cabeças de verduras: um mosaico de cores e texturas que jogam com a conversa de domingo.
Um homem está bravo porque alguém foi embora antes de resolver um problema, outros dois porque um jura de pés juntos que acabou determinada fruta, mas o outro não acredita e faz cara de quem está disposto a discutir… Típico espetáculo da vida cotidiana, que acontece em frente ao cemitério, aquele que, se visto de cima, lembra um coração. Ali, entre barracas coloridas e risadas, me lembro porque gosto tanto de feira e de gente.

Dez horas e a feira ainda está cheia. A primeira parada foi na barraca de café, onde não dá pra ser racional. Impossível sair de lá sem um pacote daquele café encorpado e perfeito. Enquanto bagunçava a sacola tentando acomodar os saquinhos, avistei a feirante inquieta, espantando um gafanhoto enorme que estava na barraca. E esse era o tema da sua manhã – ela já tinha brigado com outros dois insetos e achava que era sinal pra desmontar tudo.

Rolê da feira
Seguindo o rolê, encontrei a barraca de pamonhas. Existem poucas pessoas que acertam a textura e o sabor do jeito que eu gosto; a maioria me decepciona, mas a daquela barraca é quase perfeita. Não resisti e levei algumas para comer ainda de manhã. A alegria estava ali, sorrindo pra mim embrulhada em folhas de milho.
Depois dei de cara com um feirante que parecia triste e cansado. Pedi tempero e ele queria me convencer a levar uma quantidade três vezes mais que eu uso. Comecei a perguntar sobre produtos diferentes, fui encontrando outras coisas que me interessaram… Aí sim, saí com três sacolas cheias e no fim da compra trocávamos segredos e truques, ele super animado. Começou a falar com tanta animação que outros clientes se aproximaram, atraídos pela conversa.
A barraca de ovos foi a próxima. Fiquei tão encantada com as colheres de pau, tão bonitas e delicadas, que saí de lá com três exemplares diferentes.
E, como não poderia faltar, dei uma passada na barraca de enfeites artesanais. Após meses de busca, finalmente encontrei o enfeite que tanto procurava, como se a feira estivesse me recompensando pela visita.
Interessante que, desde que me mudei, ainda não entrei no cemitério em si, nem em dia de feira. Cheguei a parar em frente ao portão, mas desisti. Coração também tem dessas, tem tempo em que a vida é só essa que acontece do lado de fora mesmo.
Foto principal: CMTU

Ana Paula Barcellos
É graduada em História pela UEL, Mestre em Estudos Literários, integra coletivos culturais da cidade e é agente cultural. Sacoleira e brecholenta, trabalha com criação de joias artesanais e pesquisa de tendências, e escreve também a coluna de Moda deste jornal. Siga os Instagram @experienciasdecabide e yopaulab
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