Por Suzi Bonfim
Para evitar um golpe fatal no ensino público do Paraná, a privatização das escolas, os trabalhadores da rede estadual decretam greve e nesta segunda-feira (3), realizam uma mobilização em Curitiba. O ato “Não venda a minha escola” contra a aprovação do projeto de lei nº 345/2024, que institui o Programa Parceiro da Escola, em tramitação em regime de urgência na Assembleia Legislativa, acontece a partir das 8h na praça Santos Andrade, no centro da capital paranaense.
A mobilização organizada pela APP-Sindicato (Sindicato dos Professores e Funcionários de Escola do Paraná) com apoio de outras entidades como a UPES (União Paranaense dos Estudantes Secundaristas), o FES (Fórum das Entidades Sindicais) e o Coletivo de Sindicatos de Londrina é a forma mais contundente de alertar a população sobre os riscos que o projeto do poder Executivo representa.
Um processo que começou com duas escolas, em caráter experimental, se aprovado pelos parlamentares no legislativo estadual, vai atingir 200 escolas em 110 municípios paranaenses este ano e, como prevê o PL nº 345/2024, será ampliado em 2025, mas sem definição do número de estabelecimentos que terão que adotar o novo modelo de gestão.
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Para os trabalhadores da educação, a proposta do governador Ratinho Júnior (PSD) não é nenhuma surpresa diante do viés privatista adotado na condução das políticas do setor, já denunciadas.
De acordo com o coletivo de entidades, a SEED (Secretaria Estadual de Educação) tem precarizado as condições de trabalho e aligeirado a formação dos estudantes, principalmente, com esvaziamento de saberes científicos dos currículos, e o uso de plataformas e aplicativos cada vez mais frequente.
Assim, sorrateiramente, a privatização do ensino público está prestes a ser uma realidade no Paraná, caso não haja uma reação à altura da sociedade e, principalmente, da comunidade escolar (professores, servidores, alunos e os pais). São mais de 70 mil professores e servidores na rede pública estadual ameaçados pela proposta de privatização.
Na berlinda estão os contratados por meio do PSS (Processo Seletivo Simplificado) que hoje tem uma garantia de contrato por um ou dois anos. Na gestão privada, a contratação passa a ser pela CLT e os servidores e professores poderão ser demitidos a qualquer momento.
Além disso, os professores também não terão garantia de hora-atividade e cumprirão carga horária cheia. O holerite de um professor com 40 horas/aula semanais de julho de 2023, em uma escola-piloto do projeto, foi R$3.202. Na prática, o valor é quase 50% menor do que os professores recebem hoje no sistema atual.
As consequências psicológicas para quem hoje está na escola pública são ainda mais tristes. Esgotados com a desvalorização profissional – é cada dia menor o número de novos profissionais na área – com a falta de condições de trabalho e cobranças de um sistema que prioriza a aprovação do aluno ao invés da qualidade do ensino, muitos estão adoecendo e saindo da sala de aula. Há escolas estaduais que enfrentam dificuldades em contratar novos professores.
Experiências negativas de privatização das escolas públicas no mundo
No Chile, a privatização da educação teve um marco significativo durante a ditadura militar de Augusto Pinochet (1973-1990). Durante esse período, o governo implementou uma série de reformas neoliberais que incluíram a privatização de diversos serviços públicos, incluindo a educação.
Nos Estados Unidos, a privatização da educação ganhou força nas últimas décadas, especialmente com a expansão das charter schools e os programas de vouchers em vários estados. Como principal característica, as escolas públicas são operadas por entidades privadas sob um contrato (charter) que oferece maior flexibilidade em troca de responsabilidade por desempenho acadêmico.
A Suécia iniciou um processo de privatização da educação na década de 1990, inspirado em parte pelos modelos de mercado do Reino Unido e do Chile. A implantação dos Vouchers Educacionais permite que os pais escolham entre escolas públicas e independentes (privadas), com financiamento público seguindo o aluno. Já as escolas independentes operam de maneira similar às charter schools nos EUA, oferecendo maior autonomia em troca de resultados educacionais.
Inúmeras avaliações, como a do professor Alberto Veronesi, de Lisboa, Portugal, no artigo “A Falácia da Liberdade de Escolha das Escolas”, revelam que o resultado nesses países é preocupante porque promovem uma maior segregação social, desigualdade e diminuição do desempenho geral dos alunos, além de um crescente elitismo no sistema educativo.
Na Suécia, Johan Wennström, sociólogo da Universidade de Estocolmo, no livro “School Choice and Social Segregation: Evidence from Sweden”, Wennström apresenta dados que comprovam como a política de cheques-ensino na Suécia contribuiu para o aumento da segregação social nas escolas daquele país.
Enfim, não dá pra fazer da educação um simples negócio onde o lucro fala mais alto. Já há problemas suficientes a serem superados para promover um ensino público de qualidade e amplo acesso.
Propostas como estas do governo Ratinho Jr. apenas tiram o foco do que é realmente importante: valorização da categoria, melhoria da infraestrutura e formação continuada de cidadãos com senso crítico e valores éticos consolidados.
É possível, mas exige empenho da sociedade.
Suzi Bonfim
Jornalista, formada na UEL, por quase 30 anos morou em Cuiabá -MT. De volta a Londrina-PR, vive a fase R de reencontros e renovação, respirando novos ares. Escreve sobre o que acredita por um mundo melhor. Instagram @suzi.bonfim
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foto: Rosemary Pinheiro Lima
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