Por Cassiano Russo, professor de filosofia
O escritor não deve dizer bobagens. Ele não deve subestimar a inteligência dos leitores com chavões do senso comum. Não, o escritor não escreve uma redação para entrar na faculdade. O escritor – se tiver algum amor pelo seu ofício – deve assumir a radicalidade metafísica de subverter a ordem da realidade da palavra, que deve ser real, absolutamente real, a ponto de tudo o que fuja do texto que carrega a palavra virar aparência, ilusão, fogueira apagada pelas palavras que jorram aos borbotões pela verve dilúvica de quem escreve. Por isso, afirmo que o escritor deve ser um radical, um terrorista das palavras. Ele deve arrancar as raízes do cotidiano, aniquilar a tranquilidade do texto tosco de foliculários que fazem pose de esclarecidos – esses marqueteiros travestidos de beletristas, cujas letras nada dizem de belo! O escritor deve dizer aos leitores que eles também participam do processo de composição da escrita, que a leitura é fundamental para que a letra se torne vida!
Não, escrever não é fazer redaçãozinha de cursinho pré-vestibular – a escrita não deve se esconder por detrás de títulos acadêmicos, porque ela não sai de um canudo de festa de formatura, ou de uma graduação, mestrado ou doutorado, mas da alma de cada letrinha, ponto e vírgula, até formar a verdade da palavra que tudo consome – sim, eu tenho diploma de licenciado e mestre em filosofia e posso lhes garantir que escrevo sem necessidade desses meus papéis-moeda.
Às vezes, a vida nos apresenta um texto medíocre – vejo muita mediocridade entre os que deveriam exercer a excelência. Nessas horas de declínio existencial, em que a realidade nada mais é do que um rascunho, o escritor deve compor um novo mundo, dar brilho à existência por meio das palavras e, então, reescrever o texto do universo – colorir esse filme velho e roufenho do cotidiano sem grandeza, inverter a lógica mercadológica de que tudo pode ser vendido, anular a publicidade de intelectuais que brilham uma luz baça com seus livrinhos de autoajuda.
Reitero que o escritor é um radical, pois escrever neste mundo pasteurizado é um ato de rebeldia.
É preciso retomar a pureza perdida de um simples gesto, é preciso escrever. E o escritor sabe disso. Ele sabe que a beleza de seu ofício está para além de qualquer convenção, ou conveniência, porque o escritor, o verdadeiro escritor está aí para incomodar, ser inconveniente, romper com as regras da superficialidade de homens doutos, aqueles que escrevem para se exibir, e não para transgredir a angústia do silêncio do marasmo monocórdio desta ficção duvidosa que é a vida, como o faz quem realmente escreve, porque sabe que a vida sem a escrita não basta.
Sim, sou um terrorista do verbo. Um revoltado das palavras.
E a minha religião é a escrita. Meus deuses se constroem conforme eu escrevo!
Eis por que afirmo que escrever deve ser um ato de rebeldia.
Portanto, escrevam, vocês que leem minhas crônicas!
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