Por Telma Elorza
“Fui uma criança mimada, tudo que queria eu tinha. Meus pais nunca falaram não para meus desejos. Agora, adulta, não consigo lidar com frustrações e sofro muito com isso. Cheguei a ser internada num hospital psiquiátrico, quando mais nova, depois de uma crise de pânico provocada por um rompimento de namoro. Mas, mesmo fazendo terapia, não consigo ser feliz”.
A leitora me mandou o e-mail, explicando que só queria desabafar, porque não consegue se abrir com as pessoas que a rodeiam. Que elas não a entendem e os pais tentam, ainda, poupá-la dos dissabores. Ela também disse que gostaria que seu caso servisse de exemplo para os pais que não dizem NÃO para seus filhos. Então está aqui, o exemplo dela.
E eu concordo com a leitora. É preciso que os pais digam NÃO para que as crianças e adolecentes cresçam sabendo lidar com as frustrações para enfrentar, depois as negativas da vida. E que dizer NÃO é um ato de amor para com essas crianças.
Aprender a lidar com frustrações é muito importante para a saúde mental
Imagine passar de uma infância/adolescência achando que tem direito a tudo e que a vida tem que se curvar aos seus desejos, para depois cair no mundão que não está nem aí para esses desejos. Qualquer coisa, mas qualquer coisinha mesmo, pode derrubar uma pessoa não preparada para isso: pode ser um emprego desafiador, pode ser um namorado que dá o fora, pode ser um vestibular que não passou. E provocar uma pane mental causada pelas frustrações com a qual nunca aprendeu a lidar.
Uma conhecida minha fazia o que podia e não podia para o filho. Mãe solo, queria compensar a falta do pai e dizia que ele teria tudo o que ela não teve. Desde bebê, ele quem mandava na casa, sempre ganhava os brinquedos que queria (e nem precisava fazer birra, era só apontar que a mãe dava). Conforme foi crescendo, ela se endividava até para que ele tivesse o celular top de linha, o tênis mais caro, os melhores colégios. Ele era bom aluno (pelo menos isso, né?) e nunca reprovou. Mas quando não passou no primeiro vestibular, ele teve o que eu chamo como o primeiro “chilique”.
Claro que foi mais que um chilique, foi uma crise forte de ansiedade/depressão. Mas o resultado é que ele se tornou rebelde, se envolveu com drogas e decaiu muito. Hoje ela luta para recuperá-lo, tirá-lo das drogas e dar novas oportunidades para o rapaz. Sofrem os dois.
Todos os psicológos e educadores estão aí, falando e demonstrando a importância do NÃO no desenvolvimento das crianças. O que mais tem na internet são artigos escritos por profissionais mais que qualificados. É só jogar no Google que vai achar uma lista.
E, por que, então os pais continuam insistindo em mimar os filhos, tentando poupá-los das frustrações? Porque é mais fácil dizer sim. Mais fácil, mais rápido e eles não terão que lidar com os “dramas”, birras e revoltas, que são mais difíceis administrar. Muito mais fácil compensar a falta de paciência, de tempo ou até a própria imaturidade emocional para lidar com os sentimentos alheios.
A conta chega
O problema é que a conta chega. A menos que a família seja milionária para fechar a criança/adolescente/jovem numa bolha, uma hora ou outra a vida vai dar uma lambada. E, mesmo nos casos dos milionários, ainda corre-se o risco de que o adulto que nunca recebeu um NÃO se prejudique ou prejudique alguém pelos seus atos mimados, como aconteceu recentemente em São Paulo, onde um jovem de 24 anos, dirigindo um Porshe em alta velocidade, colidiu com um carro de aplicativo e matou seu motorista. A mãe desse jovem ainda retirou o filho do local, em vez de deixá-lo assumir seus erros. Erros pelo quais outros pagaram.
É preciso impor limites. É preciso dizer NÃO para salvaguardar a saúde mental do adulto que seu filho vai se tornar um dia. Quem apenas diz sim não ama o filho como ele precisa ser amado. Pense nisso.
Espero ter ajudado.
Tem dúvidas sobre relacionamentos? Mande um e-mail para telma@olondrinense.com.br
Quem é a Tia Telma
Telma Elorza é jornalista, divorciada e adora dar pitaco na vida dos outros. Mas sempre com autorização.
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Arte: Mirella Fontana
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