Por Fábio Luporini
É triste ver que, enquanto uns deliciam-se com os mais elaborados pratos da alta gastronomia, outros, sem alternativa, lambuzam-se com restos de comida encontrados nos lixos ou em ossos descartados. Um retrato da fome que atinge 19,1 milhões de brasileiros, em alguma medida, conforme dados do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil. O problema não é de escassez de alimentos devido a crises produtivas, mas, sobretudo, de ingerência política.
Aparte o fato de que o ser humano é o único animal que diversifica sua alimentação e cria pratos e conceitos com os diversos alimentos que consome, está faltando o básico para a nutrição e sobrevivência das pessoas. Nos últimos meses foi possível assistirmos, entristecidos, seres humanos caçando restos de comida em caminhão de lixo, ossos descartados por supermercados e pessoas desmaiando de fome em filas de postos de saúde. Enquanto uns têm muito, outros têm nada.
O filósofo político Thomas Morus, mais de 500 anos atrás, já imaginava em “A Utopia” uma sociedade cuja fome não existira, marcada pela distribuição e acesso igualitário aos bens de consumo necessário à vida. Pensador inglês, acabou morto por discordar religiosamente do então absolutista Henrique VIII, do qual era amigo. O próprio Jesus Cristo veio ao mundo pregando a distribuição das riquezas aos pobres. Filosófica ou religiosamente, essa é uma discussão que permeia a construção de qualquer sociedade. E só será resolvida quando virar pauta política, quando entrar nas prioridades dos que almejam o poder.
Enquanto isso, infelizmente, assistiremos a situações desumanas como as que vimos no Brasil de 2021. E estaremos fracassados como sociedade. O arcebispo Dom Hélder Câmara (1909-1999) diz que “a fome dos outros condena a civilização dos que não têm fome”. De fato, os que não passam fome estão condenados a uma sociedade falha se não conseguirem suprir as necessidades dos famintos com o tanto de recursos disponíveis no mundo globalizado.
Fábio Luporini
Sou jornalista formado pela Universidade Norte do Paraná e sociólogo formado pela Universidade Estadual de Londrina (UEL) . Fui repórter, editor e chefe de redação no extinto Jornal de Londrina (JL), atuei como produtor na RPC (afiliada da TV Globo), fundei o também extinto Portal Duo e trabalho como assessor de imprensa e professor de Filosofia, Sociologia, História, Redação e Geopolítica, em Londrina.
Foto: Valmir Neves Fernandes/MST-PR e Giorgia Prates/Fotos Públicas