Por André Luiz Lima
Na arte dos encontros, renovo energias, me abro ao desconhecido, deixando fluir o que está se abrindo naquele momento.
O mês de dezembro foi de valiosos encontros inesperados, que encerram o ano e abrem o próximo com novos olhares. Estive em vários estados e lugares fantásticos deste nosso Brasil extraordinário. Cada lugar parece um país diferente, com suas histórias, culturas, crenças, costumes e sabores que, de qualquer forma, compõem todos nós.

Em resumo, as pessoas são boas. Como dizem por aqui, “têm coração bom”, e nesse caminho, sempre me sinto protegido. Como costumo dizer, isso é para quem tem olhos para ver e coração para sentir.
Ouro Preto levantou as mãos para ser contado aqui, como mensagem Ano Novo e também como um convite à reflexão.
Ouro Preto é mais do que uma cidade; é um encontro com a história e a alma do Brasil. Ao caminhar por suas ruas de pedra, ladeadas por casarões coloniais, somos transportados ao século XVIII, quando a antiga Vila Rica era o coração pulsante do ciclo do ouro. Sua importância histórica não pode ser subestimada: foi palco da Inconfidência Mineira, um dos primeiros movimentos de luta pela independência do país, e um símbolo do impacto da exploração colonial em terras brasileiras.

Além de sua relevância histórica, Ouro Preto é um verdadeiro santuário artístico. Reconhecida como Patrimônio Cultural da Humanidade pela UNESCO, a cidade guarda algumas das maiores jóias do barroco brasileiro. Suas igrejas, como a de São Francisco de Assis e a de Nossa Senhora do Pilar, são obras-primas que transcendem o tempo, com esculturas de Aleijadinho e pinturas de Manoel da Costa Ataíde que refletem o encontro entre técnica, espiritualidade e cultura local.
Cheguei a Ouro Preto numa noite, depois de um dia cansativo. Minha pousada era ao lado da Igreja de Nossa Senhora da Conceição. Embora exausto, os sinos começaram a tocar, e, junto com o encanto do lugar, senti um convite ao mágico: ser acolhido pela gentileza, pela história e pela beleza. Fui até a porta da igreja, onde estava acontecendo uma missa. Fiquei maravilhado com a arquitetura barroca, os cânticos e os rituais, com as portas abertas, como se dissessem: “Entre, André, seja bem-vindo.”

Assim cheguei a Ouro Preto, trazendo comigo a saudade da minha avó mineira, do tempo da família reunida com café, pão caseiro quentinho com manteiga e doce para acompanhar. Um cuidado que parecia ingênuo, mas que era imenso. Ao abrir a janela do meu quarto na pousada, vi a paisagem e, com ela, revisitava meu passado enquanto me colocava no presente. Que sorte a minha, pois tive a mesma gentileza no café da manhã, preparado com carinho e mãos suaves de Luciana, que alegrou meu coração.
Caminhei pelas ruas alegremente, pois o lugar acolhe entre subidas e descidas, sempre com um olhar a descobrir: uma janela com as namoradeiras, um gato, ou alguém que lhe diz “bom dia”. As senhoras das novenas já me reconheciam e diziam: “Lá vem o André.” E completavam: “Meu filho, vem tomar café.”
Claro que comi muito pão de queijo e não deixei de experimentar o frango com quiabo das lembranças da minha querida tia Nice, que cozinhava no fogão de lenha enquanto eu brincava, sob os olhares do Pico Agudo. Este já foi tema da Arte dos Encontros e fica aqui o convite para vocês relembrarem: Meu Extraordinário Encontro com o Pico Agudo.
Encontros com os bordados
A palavra saudade veio em vários cantos deste lugar e assim fui caminhando até chegar ao Museu da Inconfidência. Logo na entrada, algo chamou minha atenção. Vi uma aglomeração que parecia um portal, vibrante e pulsante: eram as bordadeiras de Ouro Preto, da ASA (Associação das Mulheres Bordadeiras), reunidas em protesto contra a mineração. Suas mãos se levantaram como metáfora e gesto concreto, chamando atenção para as consequências catastróficas desse ciclo de exploração – ecológicas, ambientais e sociais.
Ali, bordavam e ensinavam a bordar, convidando quem quisesse a se unir. As linhas e agulhas em suas mãos eram símbolos de resistência, de consciência e de cuidado. Enquanto bordavam, reafirmaram que todos dependemos uns dos outros. Era uma lição sobre união e paciência: assim como várias mãos no planeta se unem para ajudar, ali, elas colocavam a linha na agulha e ensinavam os primeiros pontos. Fui acolhido como família e senti que nada realmente é por acaso. Basta olhar, olhos nos olhos.

Visitar Ouro Preto é encontrar o Brasil em sua essência. É perceber que, entre o brilho do ouro e o peso das pedras, pulsa uma arte que transcende séculos, convidando-nos a apreciar, preservar e dialogar com nosso passado para compreender quem somos hoje.
A reflexão que deixo, neste encontro com Ouro Preto, é que, mesmo em meio às lutas, há mãos que cuidam e se unem para proteger a todos nós. Cabe a cada um de nós não apenas ler esta coluna, mas também dar as mãos. E, quem sabe, ensinar com paciência quem ainda precisa aprender a dar os primeiros pontos.
Deixei Ouro Preto cantando a música do nosso mineiro Milton Nascimento:
“Amigo é coisa para se guardar
Do lado esquerdo do peito
Dentro do coração.”
E assim vou seguindo na Arte dos Encontros.
Viva a Vida, André
Foto principal: Pexels

André Luiz Lima
Londrinense, ator, diretor, professor, palestrante e produtor cultural. Siga os Instagrans de André, @allconnecting e @aondevaiandre
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Respostas de 2
Essa matéria me fez voltar no tempo, como estudante de artes visuais em Marília SP. Quando em uma excursão conheci Ouro preto, hoje 42 anos depois planejo ir com minha companheira de todos os momentos para que ela sinta o mesmo que senti naquela época , diante desse fragmento histórico do nosso país
Você continua contando.. com imensa sensibilidade e beleza! Grata SEMPRE!!