Missão Casa Verde completa 10 anos acolhendo pessoas em situação de rua

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O trabalho que teve início em 2013 tem resultados inversamente proporcionais à crescente demanda. A Casa Verde hoje abriga apenas mulheres

Suzi Bonfim

O LONDRINENSE

Neste mês de março de 2023, a Missão Casa de Verde que acolhe pessoas em situação de  rua, em Londrina, completa dez anos de fundação, sem muito a comemorar. Afinal, a crescente demanda pelos serviços da instituição revela um problema socioeconômico que não corresponde ao modelo de desenvolvimento que se espera de uma nação com tantas riquezas como o Brasil, mas corrobora para evidenciar o abismo criado pela má distribuição de renda  cada dia mais profundo.

Segundo o presidente da organização não governamental (ONG), Márcio Eduardo da Silva,  a estimativa atual é de que existem em torno de 6 mil moradores em situação de rua em Londrina. “Há 10 anos, eram 700 a 800, na cidade”, compara. O pior é o sentimento de frustração por não ter os resultados que deseja, mesmo assim, persiste porque sabe da necessidade do acolhimento. “Sou feliz por encontrar no meio de tantos que não querem ajuda, quem quer e precisa. Fico feliz ao saber das pessoas que já passaram pela Casa Verde, muitas vezes, por problemas com drogas vivendo nas ruas, que hoje é pai, tem uma família e está na Bahia, Santa Catarina ou aqui mesmo em Londrina e reconstruiu a vida depois que esteve na nossa casa”, garante Márcio.

Márcio Eduardo da Silva, presidente da Missão Casa Verde

EMPENHO – “Olho para o que deu certo. Não deixo o sentimento de fracasso me abalar porque este é um problema sistêmico no Brasil. A gente trabalha para dar oportunidade para quem quer, mas é uma minoria com este desejo”, afirma. Segundo a administração da entidade, até o ano passado, cerca de 1,7 mil pessoas receberam alimentação, moradia e cuidados de saúde viabilizados junto ao serviço público do município.   

A Missão Casa Verde, atualmente, atende 20 mulheres em situação de rua. Até meados deste ano, segundo Márcio da Silva, vai entrar em funcionamento o espaço exclusivo para homens. São mais 35 vagas. O público da ONG é encaminhado pelo Serviço Especializado para Pessoas em Situação de Rua (Centro POP), da prefeitura de Londrina. Uma Central de Vagas monitora as quatro instituições de acolhimento da cidade e distribui as pessoas que precisam de um lugar para dormir, tomar banho, e se alimentar. Outros serviços como atendimento psicológico e assistência social também são oferecidos. 

 “Começamos a atender as mulheres porque não havia nenhuma instituição cuidando delas na cidade. A maioria é vítima de violência doméstica e enfrenta problemas com droga”, relata Márcio Silva, presidente da Casa Verde. Em sete meses (agosto de 2022 a fevereiro de 2023) , foram atendidas 314 mulheres.

Ao optar pelo acolhimento de mulheres, Márcio – que começou sozinho este trabalho depois de pedir demissão na empresa de ônibus onde trabalhava como porteiro, em Londrina- lembra que o perfil feminino exige um atendimento diferenciado, principalmente, em relação ao espaço físico. “A dinâmica com as mulheres é outra. Você pode ter 200 homens em um barracão e não ter problemas. Já as mulheres têm dificuldade com muita gente, gostam de cuidar da casa, querem espaço. O ideal é ter apenas três ou quatro mulheres em um mesmo quarto”, constata. 

Desde 2016, quando passou a receber as pessoas encaminhadas pelo Centro POP, a Missão Casa Verde tem uma estrutura profissional com uma administração, assistente social, psicóloga, educadores (4), uma cozinheira e um funcionário de serviços gerais. 

Nos primeiros três anos, o trabalho de acolhimento de pessoas em situação de rua era realizado por Márcio da Silva e a manutenção da casa era feita com a ajuda de doações. A dedicação era exclusiva para o projeto, de onde o ex-porteiro também tirava o sustento pessoal. Na época, as pessoas em situação de rua abrigadas por ele, tinham como contrapartida ajudar nos serviços domésticos e trabalhar na marcenaria cuja produção gerava parte dos recursos de manutenção. Mas, por questões legais, segundo o presidente da Casa, o espaço foi desativado e os acolhidos agora fazem outras atividades. Com a estrutura melhor do projeto, Márcio se casou e abriu uma empresa de jardinagem. 

Andrezza de Vasconcelos, acolhida há seis meses, busca meios pra sair dali

RECUPERAR A VIDA – A história de vida das pessoas em situação de rua, geralmente, está ligada ao uso de drogas e/ou conflitos familiares. Tudo é sempre muito triste de ver e ouvir. Tratar estas situações leva tempo e, assim, tem gente  que fica por um longo período nas instituições até se fortalecer e seguir um rumo na vida. 

A ex-usuária de drogas, Andrezza Cristina de Vasconcelos, 47 anos, deixou as ruas  há seis meses. Ela falou com O Londrinense por uma chamada de vídeo e, bastante emocionada, chorou ao lembrar os detalhes difíceis como o acidente em que quase morreu, quebrou a bacia e teve que ficar em uma cadeira de rodas. Além disso, com a visão comprometida pela catarata ela não pode estudar e fazer outras tarefas na casa. Andrezza disse que aguarda a liberação do Benefício de Participação Continuada (BPC) do Governo Federal para alugar uma casa e voltar a viver sozinha. Ela reconhece que a vida nas ruas e o vício são um atrativo, mas resiste. “Sou calejada da rua. A Casa Verde foi a melhor coisa que me aconteceu, tenho segurança, banho, comida e cama pra dormir. Os funcionários, educadores e assistentes, todo mundo me ajuda. Só tenho que ter força de vontade e querer a mudança”, admite a mulher.

Outra acolhida, desde novembro do ano passado, uma mulher trans que não quer ser identificada, foi resgatada de um cárcere privado dentro da própria casa. Maria (nome fictício) foi enganada por uma mulher depois que ela foi agredida na rua, perdeu o olho direito e precisou de ajuda. Na Missão Casa Verde, Maria, que está quase cega também do olho esquerdo, aguarda o atendimento em um hospital. Aos 46 anos de idade, recebe o auxílio família de R$ 400,00. Destes, R$ 200,00, vão para pagamento de um empréstimo consignado. “Estou aqui para tentar colocar a vida no lugar. Como apoio da Casa vou fazer a cirurgia e quem sabe voltar a trabalhar”, diz com esperança.

A Lei 12.684/2018, declara a entidade como de utilidade pública em função do acolhimento de pessoas em situação de risco social. Por segurança das mulheres vítimas de violência doméstica abrigadas na casa, o endereço não é divulgado pela coordenação. O telefone de contato é o:  43 3026-7233

fotos: internet e Missão Casa Verde

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