Por Cassiano Russo, professor de filosofia
Tenho tanto desprezo por mim mesmo, que o veneno alheio dificilmente me fere. Sim, cultivo há anos o autodesprezo. É uma prática quase terapêutica para a minha baixa autoestima. Vejo-me como Diógenes, o cão. Embora eu creia ser mais o cão do que o filósofo cínico. Acho que meu cinismo talvez seja uma gestualística que pratico frequentemente na minha lida com as pessoas, no meu cotidiano de vira-latas dos trópicos. Sou um reles animal tropical – e disso tenho plena convicção. Um latino sem eira nem beira. Essa é a minha moral: moral de cachorro, com meus latidos expressos em textos despretensiosos. Animal tropical. Cachorro de rua. Um vira-latas caipira, para complementar quem eu sou. Porque não tenho o delírio dos meus conterrâneos, com seus narizes empinados, metidos a europeus, ou americanos, como se negassem suas raízes de Brasil.
Para ser sincero, não me vejo muito distante de Pedro Juan Gutiérrez, em sua Trilogia Suja de Havana. Daí a minha preferência por ser um animal tropical, título, aliás, de um dos livros do escritor cubano.
Assim, reforço que há um elemento a mais nessa minha latinidade tropical: meu jeitinho canino de ser. E, com esse meu jeitinho, a maior das desgraças do universo encontra um lugar em meu coração vagabundo. Afinal, sou animal sem pedigree, dono ou raça.
Mas não se enganem quanto ao que digo. O meu autodesprezo não é coisa ruim, pois ele me torna mais forte diante de situações adversas. Por isso digo que ser animal tropical é uma profissão de alto risco, pois não sei o que pode me acontecer. E, no final das contas, não importa o que me aconteça, porque tenho a minha latinidade de animal desgarrado.
E, à parte os animais ferozes, sou manso e receptivo, como todo bom vira-latas.
Esse é meu jeito de ser. E não sei se vocês concordam comigo.
Foto: Reprodução da internet