Aos 85 anos, completados no último dezembro, Londrina é uma cidade jovem que já passou por diferentes transformações da paisagem urbana, muitas delas em edificações das ruas comerciais do Centro.
“Mas daqui a 100 anos, como vai estar o Centro Histórico de Londrina?”.Este é o grande questionamento da professora Eloisa Ramos Ribeiro Rodrigues, do Departamento de Arquitetura e Urbanismo, do Centro de Tecnologia e Urbanismo (CTU), que durante três anos realizou pesquisas para identificar modificações ocorridas em eixos comerciais da área central, desde o início da cidade. Com o projeto “A paisagem da rua comercial em Londrina: transformações e permanências“, do Departamento de Arquitetura e Urbanismo, diversas pesquisas e Trabalhos de Conclusão de Curso (TCCs) foram produzidos por estudantes de pós-graduação e graduação, sempre com foco em determinada rua ou avenida da região estudada.
Um destes objetos foi a Avenida Higienópolis, entre as ruas Sergipe e Alagoas, que foi objeto de estudo desenvolvido para o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) da estudante de Arquitetura e Urbanismo, Marília Brandão, durante o ano de 2019.
As pesquisadoras identificaram as edificações residenciais construídas nos primeiros anos de Londrina e aspectos delas que ainda permanecem. De acordo com a professora, o espaço abrigou casarões de diversas “famílias abastadas”, mas atualmente, apenas 16 casas permaneceram, sendo que oito delas se mantém exatamente da forma como foram construídas, incluindo seu uso residencial.
Outras, porém, foram demolidas e substituídas por edifícios verticais ou foram ainda adaptadas para o comércio. Ela cita o caso de um dos casarões da família Fuganti, que atualmente é uma drogaria. Esta edificação teve suas características iniciais modificadas ou escondidas, com os novos elementos da fachada comercial. Essa ação se explica, segundo Eloisa, pelo perfil de Londrina como uma cidade de prestação de serviço, nas mais diversas áreas, como saúde e educação. Por este motivo, é muito comum que as antigas casas da área central sejam alugadas para suprir a demanda comercial.Já as construções verticais, também responsáveis pela transformação da paisagem urbana, iniciaram-se na Higienópolis na década de 1980. Como conta a professora, no trecho selecionado, há apenas nove edifícios verticais, entre residenciais e comerciais. Apesar de poucos, eles alteraram sensivelmente o caráter histórico da Avenida, ou seja, a própria paisagem urbana.
Ruas – Outro recorte da pesquisa que mostra a expressiva transformação do Centro Histórico da cidade, compreende as ruas Belo Horizonte, Santos e Paranaguá, também no quadrilátero central. Segundo levantamento feito em 2018, pela então estudante de Arquitetura e Urbanismo, Beatriz Maia Rodrigues, de um universo de 891 lotes originais, foi identificada a permanência de 248 edificações residenciais. Entre elas, 53 ainda mantém o uso residencial, e outras 195 foram adaptadas para comércio.
Novamente, a professora destaca que muitas das casas foram completamente descaracterizadas. Portanto, elas perderam os elementos originais e expressivos da identidade, para dar lugar à modernização exigida pelas empresas. Porém, há bons exemplos de preservação. Ela cita uma hamburgueria localizada na Rua Santos, que optou por manter características originais da casa, como o jardim frontal, os elementos decorativos e o piso. Eloisa Rodrigues afirma que atitudes simples, como neste caso, poderiam ser repetidas em outros, colaborando na manutenção da paisagem urbana histórica.Nesta pesquisa, a recém-formada Beatriz também foi a campo, fotografou e elaborou um Roteiro com 15 residências remanescentes, que ainda mantém características originais.
O material está em avaliação pela Diretoria de Patrimônio Histórico de Londrina. Ele poderá ser utilizado futuramente como roteiro de turismo histórico na cidade, como pode ser visto na imagem abaixo. Um das casas, por exemplo, é sede da Divisão de Música, da Casa de Cultura, localizada na Rua Tupi (item 8).

Outra constatação feita neste estudo é que esta região também viveu, na década de 80, o fenômeno da verticalização, semelhante ao que se passa atualmente na Gleba Palhano. Entre as ruas Belo Horizonte, Santos e Paranaguá, muitas casas foram substituídas por edificações verticais.
Início – A verticalização não é vista, entretanto, na Avenida Duque de Caxias, uma importante rua de comércio nos primeiros anos da cidade. Ao contrário disso, 70% das construções comerciais ainda estão lá da forma como foram construídas a partir da década de 30. “É uma avenida que parou no tempo”, constata a professora. A avenida foi objeto de pesquisa dos primeiros estudos do projeto, como apresentado no Jornal Notícia (edição 1.365, de 2017).
O que mais mudou na Duque de Caxias, segundo Eloisa, foram as fachadas, modernizadas de acordo com a estética do comércio atual, semelhante ao que ocorre nas residências dos outros locais estudados. A Avenida, que chegou a ser um dos principais pontos comerciais da cidade, já não tem mais a mesma notoriedade, dado o crescimento do comércio, primeiro, na Rua Sergipe, seguido pelo Calçadão de Londrina, e mais recentemente, pelos vários shoppings, em outras regiões.
Foi utilizada para o desenvolvimento da pesquisa a Morfologia Urbana, método de análise da paisagem urbana, que estuda a evolução da forma física da cidade. Além disso, foram consultados arquivos oficiais, como documentos do Setor de Cadastro Imobiliário, da Prefeitura de Londrina, análise da Planta Azul da cidade e da foto aérea de 1949. Para constatar as modificações, foram feitas observações em campo, no recorte entre as ruas Benjamin Constant e Alagoas.
Preocupação – A preocupação da professora, que atua na área de Urbanismo, é como se dá a preservação histórica da cidade. “Há uma mudança agressiva quando se fala em paisagem histórica e as regras de controle são ainda frágeis. A cidade vai mudando e já não se reconhece muita coisa”, afirma. Por isso, ela destaca que o projeto tem foco na documentação da memória da cidade.
Existe, porém, um embate entre a preservação histórica e desenvolvimento da cidade. Como exemplo, Eloisa Rodrigues afirma que surge a necessidade de se alargar vias para melhorar o trânsito e a mobilidade urbana. Por outro lado, segundo ela, essa readequação provoca a demolição de construções que guardam a memória da cidade.No âmbito da administração pública, ela constata a necessidade de se definir guias de Design Urbano para conservação de elementos históricos da cidade. Esta conservação possibilitaria, por exemplo, o turismo histórico, como proposto pelo TCC de Beatriz Maia Rodrigues.
Foi com foco na preservação que o projeto terminou enquanto pesquisa no ano passado, mas continua agora como projeto de extensão. Os estudos são realizados dentro do projeto “Escritório Modelo OCAS”, coordenado pelo professor Antônio Carlos Zani, do Departamento de Arquitetura e Urbanismo. Em parceria com a Diretoria de Patrimônio Histórico de Londrina, da Prefeitura de Londrina, são elaboradas fichas de cadastro patrimonial de edificações da cidade, que ficam disponibilizadas no Sistema de Informação Geográfica de Londrina (SIGLON). “É uma parceria relevante, um trabalho prático para a comunidade de Londrina”, afirma Eloisa Rodrigues.
Projeto sobre a Avenida Duque de Caxias é selecionado no Edital PROMIC
Na mesma linha do projeto de pesquisa sobre a preservação do patrimônio histórico, quatro ex-alunas do curso de Arquitetura e Urbanismo da UEL foram selecionadas na última edição do Programa Municipal de Incentivo à Cultura (PROMIC), de Londrina. Elas propuseram o projeto “Avenida Duque de Caxias: um patrimônio histórico entre permanências e transformações” e foram contempladas com R$ 40 mil.

Elisa Roberta Zanon, Camila Silva de Oliveira, professora Eloisa Ramos Ribeiro Rodrigues (ao centro), Priscila Henning e Ana Claudia de Souza Santos
Camila Silva de Oliveira, Elisa Roberta Zanon, Priscila Henning e Ana Claudia de Souza Santos, juntamente com a professora Eloisa Rodrigues, pretendem realizar diversas ações para apresentar a história da Duque de Caxias. “Queremos aproximar a pesquisa que a gente faz da população”, afirmam.
A proposta é realizar exposições itinerantes de painéis e fotos, além de palestras, em diversos pontos da cidade, como na Prefeitura de Londrina, em museus e shoppings. Também será produzido um livreto, que servirá de guia sobre a Avenida, para ser distribuído em instituições de ensino e museus. O objetivo final é a publicação de um livro sobre a Avenida Duque de Caxias.Segundo as pesquisadoras, o PROMIC é o mais importante programa de incentivo à cultura do município e que contempla várias linhas e vertentes.
O projeto foi selecionado, por exemplo, na Linha de Preservação do patrimônio material e imaterial. “Esta é uma das poucas ações que fomenta a preservação do patrimônio histórico na cidade”, constatam.