Meu extraordinário encontro na Colômbia

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Por André Luiz Lima

Senhoras e senhores, abrem-se as cortinas de um belo e emocionante espetáculo na Arte dos Encontros.

Sejam todos bem-vindos à história que vou contar. Uma história de simplicidade!

Eu, deste lado, respiro, fico em silêncio, entro no agora, para contar emocionado que sou e estou em encontros de contos de fadas, santos e milagres desses mágicos seres da natureza. Vamos lá!

Passei pela cidade de Pasto, na Colômbia, a muito tempo atrás para apresentar meu espetáculo solo: “Como morria e ressuscitava Lázaro, o Lazarilho“.

A trajetória de preparação e processo desse personagem da literatura espanhola, produzido no Equador, se esbarra no nosso nordeste de Ariano Suassuna e no Auto da Compadecida e, por isso, essa história foi tão generosa, cheia de milagres, portas que se abriram com um sopro de vento e tempestades, quebrando paradigmas a todo instante e era apenas dizer sim.

E lá fui eu, descalço por terras desconhecidas, olhos ingênuos, aberto às possibilidades que se abriram nas diversas formas da vida em seus detalhes.

Na Arte dos Encontros, vou encontrando os vários pedaços de mim, me reencontro nos rastros que deixei, nas minhas mortes e ressurreições, das que me lembro, pois algumas morreram para sempre e nunca, nunca ressuscitaram.

Entendendo agora o porquê da profundidade dessas palavras, estou chegando de terras andinas, lugar sagrado, de respeito, onde rege a natureza.

O destino me traz de volta para Pasto. Estive em dois festivais de teatro na Colômbia, Festival Internacional de Teatro de Pasto e Festival La Flor del Actor, em Bogotá, organizado pela paixão e competência de Mérida Urquia.

O festival da cidade de Pasto é palco de um dos festivais mais importantes do mapa teatral colombiano e latino-americano, dirigido pelo brilhante Alberto Bolaños que completou 26 anos, neste outubro de 2022, e segue com força vibrante. O festival aconteceu em um local mágico, às margens do Vulcão Galeras que, às vezes, se faz presente, para lembrarmos de estarmos atentos com a vida, transformando-a em solo fértil. 

Alberto, com sua força, simplicidade e amor, conseguiu reunir artistas de diversas localidades dando sequência aos sonhos a partir dos encontros, trocando as vivências, se abastecendo e espalhando sementes em solos férteis.

Não é fácil explicar em palavras minhas a vivência pelos Andes, mas um fator primordial a ter em conta é contemplar a Cosmovisão Andina que é multidimensional e, como tal, representa um desafio para o pensamento ocidental.

Cada civilização se desenvolveu com base na sua percepção do mundo e do cosmos. Os princípios, valores e crenças constituem uma cosmovisão ou paradigma. Podemos definir paradigma como “o chapéu de chuva sob o qual uma sociedade concebe e pensa a sua realidade, como a percebe, lhe atribui um sentido e significado, e também a sente, a vive e actua sobre ela.” (Bio Nicolás Pauccar Calcina)

A flor del actor – Bogotá – Foto: Acervo Pessoal

Isso significa que não podemos simplesmente impor nossas ideias diretamente em nossas próprias categorias conceituais. A tentação de fazê-lo, no entanto, é forte e bastante automática para que estamos acostumados a fazer sentido das coisas novas, relacionando-as com o que já sabemos.

Se quisermos explorar a ‘Cosmovisão Andina’, precisamos deixar a nossa maneira normal de pensar sobre o mundo e abordá-la com espaço para que seja algo novo, precisamos mais acomodar novas informações permitindo mudar a forma como vemos o mundo – abrir a mente, abstrair. 

A cidade de Pasto, capital do estado de Nariño, foi fundada em 1539, no chamado ‘Nudo de los Pastos’, onde a cordilheira dos Andes divide-se em três ao sul da Colômbia, impactando com suas paisagens de diversos tons de verde de centenas de pequenos cultivos de diferentes produtos. Desde a cidade de Pasto, a capital, é possível viajar para conhecer lagoas, vulcões e o ecossistema de Páramo, assim como vales com clima agradável e praias tropicais.   A riqueza natural de Nariño é enorme, tem todos os tipos climáticos, com alturas desde os 2 até os 4.760 metros sobre o nível do mar, e por isto aqueles que o visitam podem andar por bosques de névoa, assim como apreciar rios e cachoeiras em reservas naturais e em Parques Nacionais Naturais. Também podemos encontrar artesanatos únicos e viver festas que unem as pessoas, sem se importar com a cor de sua pele.

As pessoas que conheci em Pasto, alunos, atores, amigos que não via a muito tempo, foram generosas e, nas suas sutilezas, pegaram nas minhas mãos para dizer com respeito: “Olha, estamos todos juntos”.

Foi emocionante a despedida, com abraços apertados, me preparando para o embarque rumo a Bogotá, para La Flor del Actor, um Festival Internacional de Teatro que destaca a figura de atores e atrizes com grande carreira criativa e impacto pedagógico no cenário mundial. Não tenho palavras para descrever essa experiência tão sensível, onde se divide espaço de afetos, trajetórias de vida, alegria e amor distribuídos em arte para dar sentido ao mundo. Foram dias memoráveis no bairro La Candelaria em Bogotá.

A maioria das construções do bairro La Candelaria – muitas delas com estilo colonial e republicano – se conservam e foram declaradas como Patrimônio Histórico. Nesta zona do centro histórico de Bogotá existem cerca de 500 instituições ou grupos artísticos, museus e especialmente o museu de Botero, que estive algumas vezes e não me esqueço, além de centros de pesquisa, teatros, restaurantes, cafés, bibliotecas e universidades.

No momento da Arte dos Encontros vivido na La Flor del Actor fiz novos amigos que vou manter nas minhas mais doces lembranças e os amigos de longas estradas, os abraços e as gostosas risadas, contam por si só a alegria de seguir vivendo.

Viva a Vida, André!

Calma, antes de fechar as cortinas ainda tem mais um detalhe.

No final da viagem fui ter meu encontro com uma amiga de confissões em Santa Marta, cidade das serras nevadas que desemboca no mar do Caribe. E assim, as histórias vão seguindo seus rumos nas artes dos encontros, onde nos reconhecemos, nos abastecemos e continuamos o caminho.

Para quem não leu minha última coluna, tem lá um texto do Hermann Hesse que diz: Viva seus sonhos. 

André Luiz Lima 

Londrinense, ator, diretor, professor, palestrante e produtor cultural.

Foto: Acervo pessoal

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Respostas de 6

  1. Os textos do André são uma lição de cultura. Todos os lugares que ele passou e todas as experiências que ele vivenciou mostram o poder de cura através da arte desses encontros que ele aborda em cada destino que passa. Os textos mostram uma visão humana da vida em essência que é lapidada em cada descoberta em contato com cada uma das pessoas e lugares mencionados.
    Lendo semanalmente os textos dá vontade de visitar esses lugares para também vivenciar novas descobertas. Viajar é ver o mundo com outro óculos. É adentrar universos estranhos que nos fazem editar e rever nossos próprios valores . Nunca voltamos os mesmos de uma viagem. E cada retorno é se banhar em um diferente oceano. Viajar para outro país de língua diferente é se desafiar para compreender e é um empoderamento imenso. Além de um filtro relevante de como está nossa habilidade de comunicação e o mais importante, como está nossa percepção do outro e do diferente sem julgamento. Parabéns André e obrigada por compartilhar todo esse universo conosco

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