O espelho sombrio de Trump

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Por Telma Elorza

A política, por vezes, nos oferece o doloroso luxo do exercício de imaginar o que poderia ter sido se os fatos tivessem ocorrido diferentes. Por exemplo, olhar para a realidade de outra nação e enxergar nela o reflexo de um futuro sombio que, por uma margem estreita, conseguimos evitar. Hoje, os EUA, servem como espelho, mergulhados numa convulsão social e política que parece não ter fim. Observar o legado do presidente estadunidense Donald Trump e seus desbobramentos nas manchetes de jornais e TVs é como vislumbrar, com uma clareza assustadora, como seria o Brasil se a extrema direita tivesse conseguido ganhar as eleições de 2022.

A vitória de Jair Bolsonaro não teria sido apenas a continuidade de um governo. Teria sido a legitimação e a aceleração de um projeto de poder com um objetivo claro: a erosão das instituições democráticas. O pararelo com Trump é direto. Durante seu primeiro mandato, Bolsonaro atacou a imprensa, o judiciário e o sistema eleitoral, assim como o fez Trump. Um endosso nas urnas teria lhe dado capital político para amplificar os ataques aos princípios democráticos, como Trump está fazendo hoje, nos EUA. Sua reação aos protestos em Los Angeles passou por cima da legalidade ao ignorar a autonomia constitucional do governo da Califórnia.

As ações do presidente estadunidense Donald Trump são um espelho terrível do que poderia ser o Brasil se as eleições de 2022 tivessem outro resultado
Imagens: Prints de vídeos da CNN Brasil

Imagine o cenário se a extrema direita tivesse ganhado: o Supremo Tribunal Federal (STF) não estaria hoje julgando os envolvidos na trama golpista. Estaria sim, sofrendo uma pressão sem precedentes, com ameaças (se ficasse só nas ameaças) físicas e impeachment para os ministros e teria nomeação de mais juízes alinhados ideologicamente, “validando” juridicamente os desmandos.

O que vemos acontecendo hoje nos EUA, com questões como imigração, economia e direitos civis – que se tornaram pontos cruciais de debate nacional e internacional – com uma retórica inflamada e decisões executivas que frequentemente desafiam normas estabelecidas, poderiam facilmente acontecer num Brasil sob o regime autoritário da direita. Durante o mandato anterior, vimos políticas que ecoram muitas das abordagens populistas e conservadoras observadas sob Trump. Aqui, a gestão ambiental, direitos humanos e economia foram áreas onde suscitaram críticas intensas tanto dentro quanto fora do país. Um segundo mandato poderia ter consolidado essas tendências, potencialmente aumentando divisões sociais e políticas já existentes.

Londrina, o reflexo do espelho na prática

Exemplo prático do que seria o Brasil neste espelho sombrio são as leis criadas pelos vereadores de Londrina, na sua maioria de partidos da direita. Só neste ano, surgiram propostas legislativas que afetam diretamente os direitos humanos, restrigindo a participação de pessoas trans, por exemplo, em acesso a serviços de saúde (como a Emenda nº 3/2025 ao Projeto de Lei nº 183/2024, que assegura especificamente apenas a MULHER gestante o direito ao acompanhamento de um enfermeiro obstetra durante todo o período de trabalho de parto, parto e pós-parto, deixando de lado os homens trans ou pessoas com útero) e inclusão social. Uma avanço na saúde pública foi usado como arma ideológica para apagar, punir e segregar uma minoria. A criação de uma Frente Parlamentar Cristã também levanta questões sobre a influência da religião na formulação de políticas públicas desenhadas para excluir e deproteger ainda mais a comunidade LGBTQIA+.

O Brasil de 2025, com todos seus imensos desafios e problemas – que são muitos e que precisam ser corrigidos – ainda é um país que respira. Desviamos temporariamente de uma bala que está ricocheteando nos EUA e cujos estilhaços podem nos atingir, como vimos com os vereadores de Londrina. Olhar para o espelho americano hoje não é um ato de presunção, mas um alerta para 2026. É o retrato do abismo que, por muito pouco, não se tornou a nossa realidade em tempo integral. Uma realidade que devemos lutar para manter longe.

Telma Elorza

Jornalista, escritora e contadora de histórias, trabalhou na Folha de Londrina por quase 20 anos e no Jornal de Londrina por outros 10 anos, locais onde atuou como repórter, redatora e editora nas áreas de Economia, Política e Agronegócio, entre outras. Em 2019, fundou seu próprio jornal, O LONDRINE̅NSE, e se tornou entrevistadora do O LONDRINE̅NSE POD. Integra o Conselho da Mulher Empresária da ACIL.

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