Por Márcia Huçulak
“Justificar tragédias como ‘vontade divina’ tira da gente a responsabilidade por nossas escolhas.”
Umberto Eco, escritor e filósofo italiano
Além de trágicas, as queimadas na Amazônia e no Cerrado estão sendo pedagógicas para quem ainda dúvida dos impactos das mudanças climáticas. Assim como também foram trágicas e didáticas as enchentes no Rio Grande do Sul poucos meses atrás.
Seca e excesso de água, situações extremas cada vez mais frequentes.
Ocorridos a milhares de quilômetros, os incêndios nos dois principais biomas do país são responsáveis pelos piores índices de qualidade de ar já registrados em cidades como Curitiba e São Paulo, por exemplo.
Obviamente, a situação nos locais onde o fogo arde de maneira nunca vista é muito mais grave, mas os impactos se espalham pelo país pela força das correntes de ventos, que transportam micropartículas nocivas. Muitas outras regiões, no entanto, também registram seus próprios focos de fogo.
Sessenta porcento do território nacional foi tomado pela fumaça. O ar pesou, e as cores do céu de muitas cidades mudaram.
O cenário alterado traz evidências que muitos ainda tendem a não acreditar.
No Paraná todo, a poluição do ar estava em nível “muito alto” na semana passada, de acordo com monitoramento da Universidade Federal do Paraná (UFPR). A capital registrou o mais alto índice desde o início das medições, há 20 anos.
O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), por sua vez, emitiu alerta para baixa umidade.
Pior seca em 50 anos, ação humana criminosa ou irresponsável, ações mitigadoras e de combate insuficientes explicam o cenário, que soma cerca de 160 mil focos de incêndio registrados em todas as regiões do país desde janeiro – o dobro dos ocorridos no ano anterior.
Impactos das queimadas
Os transtornos de curto prazo para saúde são inúmeros: agravamento de problemas respiratórios (como asma e bronquite), irritação nos olhos e conjuntivites, maior risco de problemas cardiovasculares, agravamento de condições crônicas, entre outras.
O resultado é mais pressão sobre o sistema de saúde, com aumento de atendimentos e internações hospitalares.
Um estudo realizado pela Fiocruz mostrou que 70% das internações hospitalares têm ligação com as altas concentrações de poluentes de queimadas nos estados mais diretamente atingidos pelos incêndios na Amazônia.
No longo prazo, os impactos são ainda mais preocupantes, já que trazem mudanças mais profundas para a saúde, como maior propagação de vetores de doenças – tema debatido em recente audiência pública que realizei na Assembleia Legislativa. A Organização Mundial da Saúde informa que hoje 25% das mortes e doenças no mundo são atribuídas a fatores ambientais.
Fala-se muito em sustentabilidade, mas pouco se faz.
Governos de um modo geral ficam na retórica do tema, sem planos de curto e longo prazo. Aliás, esse é um dos grandes erros dos políticos em geral, que só pensam no que impacta nos próximos quatro ou, no máximo, oito anos.
Precisamos urgentemente de um plano de longo prazo, com ações concretas e legislação adequada, para proteger a exploração desordenada das nossas matas e florestas, incentivar o plantio e reflorestamento nas cidades, diminuir a pobreza e ofertar moradia para evitar os problemas advindos da ocupação irregular nas cidades.
Sim, diminuir as desigualdades é uma das maiores ações para a tão falada sustentabilidade.
Combater as mudanças climáticas começa na nossa cidade, no bairro, na rua, na nossa casa, com ações simples, como bom uso da água, separação dos resíduos e adoção de um estilo de vida saudável. Na alimentação, descascar mais e desembalar menos.
O pior que podemos fazer como sociedade é manter a situação no compasso que está. Estamos há décadas discutindo o problema, período em que as evidências de um futuro ambientalmente nefasto ganharam contornos mais claros ao mesmo tempo em que o negacionismo das ciências do clima também cresceu. Nós, adultos de hoje, vamos pagar um preço alto pela inação. As gerações futuras – nossos filhos e netos – pagarão muito mais caro.
Foto principal: Jonathan Campos/AEN
Márcia Huçulak
Como secretária de Saúde de Curitiba (2017/2022), liderou o enfrentamento da pandemia de covid-19 na capital – trabalho reconhecido nacionalmente. Formada em Enfermagem pela PUC-PR, tem mestrado em Planejamento de Saúde pela Universidade de Londres (Inglaterra) e especialização em Saúde Pública pela Fiocruz. Elegeu-se deputada estadual em 2022 pelo PSD, sendo a mulher mais bem votada do estado e a mais votada (entre homens e mulheres) de Curitiba. Encontre a Márcia Huçulak nas redes: site
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