Por Márcia Huçulak
Quando surgiram, os automóveis não tinham muitos dispositivos para preservar a integridade física dos usuários – e assim foi ao longo de muitos anos do desenvolvimento desse mercado.
Após o início da produção industrial do produto que marcou o século 20, demorou quase 50 anos para surgir o cinto de segurança. Depois disso, o uso obrigatório do equipamento, que salva inúmeras vidas diariamente, só começou a ser implementado nos anos 1970 – e só chegou ao Brasil em 1997, ou seja, 90 anos depois que Henry Ford popularizou os carros.
Quase desnecessário lembrar que os carros hoje são infinitamente mais potentes, confortáveis e seguros (com vários itens além do cinto) do que eram algumas décadas atrás.
O caso automobilístico nos permite uma boa analogia para entender melhor o cenário atual diante do uso da internet, das redes sociais e das tecnologias digitais.
A correlação entre as duas áreas me ocorreu na preparação da audiência pública “Tecnologia e redes sociais: danos e soluções frente ao uso excessivo entre crianças e adolescentes”, que realizei na Assembleia Legislativa na última quinta-feira (22/08), reunindo especialistas altamente qualificados em diferentes áreas ligadas ao tema. (Clique aqui e saiba mais sobre a audiência.)
A grande diferença entre eles é que não podemos esperar tanto tempo. O “cinto de segurança digital” precisa ser providenciado com urgência, sob pena de condenarmos uma geração inteira (senão mais de uma) ao retrocesso cognitivo, com sérios prejuízos no desenvolvimento pessoal, social e profissional.
É preciso lembrar o óbvio: crianças e adolescentes de hoje são o futuro, de forma que o dano não é só individual, mas para toda a sociedade.
Não temos o luxo de esperar mais evidências para agir. Já há inúmeros dados e pesquisas mostrando o aumento de casos de ansiedade, depressão, tentativas de suicídio, crianças isoladas socialmente, ciberbullying, agravamento das miopias, problemas de coluna, obesidade… Os problemas são crescentes nas diferentes facetas da saúde.
Quanto mais se estuda o tema, mais clara fica a urgência.
A tecnologia não vai parar de se desenvolver e de impactar a maioria da população. É preciso lembrar também que ela traz inúmeros benefícios, como ganhos de produtividade, aumento da conectividade, entre muitos outros. Há coisas fantásticas.
O que precisamos é saber como lidar com seus impactos, principalmente na população mais jovem. É na infância e adolescência que se desenvolvem habilidades e conexões cerebrais que moldam o futuro de cada pessoa.
O que estudos mostram é que o uso excessivo e descontrolado de telas vem danificando a formação do órgão que comanda nosso corpo, afetando sua estrutura e funcionalidade. Há casos de atrofia cerebral gerada por uso muito precoce de telas em bebês! Esse dano não se recupera jamais.
Ao lado desse tipo de problema, a navegação irrestrita pelas redes cria uma exposição a um universo de pessoas desconhecidas, muitas das quais interessadas em golpes, pedofilia e outros crimes contra uma massa de jovens vulneráveis.
Vejam a contradição. Mães e pais costumam colocar suas crianças e adolescentes para dentro de casa a fim de garantir-lhes segurança. Mas as deixam soltas nas redes sociais, que são o verdadeiro perigo, com os pequenos expostos sem nenhuma proteção.
O leque, enfim, é muito amplo. Não é mais aceitável que pais não tenham ciência disso.
Como lembrou no encontro a médica Luci Yara Pfeiffer, da Sociedade Brasileira de Pediatria, o problema não começou com as crianças, começou com os adultos.
No entanto, muitos adultos hoje fazem parte do problema (na forma de se manterem distantes da relação que seus filhos têm com as telas) e precisam passar para o lado da solução, numa atuação conjunta entre família, governo, escolas e legislativo para criação de um ambiente digital saudável, seguro e equilibrado.
É urgente colocarmos “cinto de segurança” para nossos pequenos.
Vivemos num mundo conectado e assim será cada vez mais. Mas que as conexões sejam de afeto e vínculo.
A responsabilidade de construir um futuro melhor é de todos nós.
Márcia Huçulak
Como secretária de Saúde de Curitiba (2017/2022), liderou o enfrentamento da pandemia de covid-19 na capital – trabalho reconhecido nacionalmente. Formada em Enfermagem pela PUC-PR, tem mestrado em Planejamento de Saúde pela Universidade de Londres (Inglaterra) e especialização em Saúde Pública pela Fiocruz. Elegeu-se deputada estadual em 2022 pelo PSD, sendo a mulher mais bem votada do estado e a mais votada (entre homens e mulheres) de Curitiba. Encontre a Márcia Huçulak nas redes: site
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