Victor Reale, que mora e estuda no país, vem sentindo os efeitos da política econômica do novo presidente argentino
Telma Elorza
O LONDRINENSE
Recentemente, os jornais brasileiros repercutiram a notícia que brasileiros estariam sendo barrados nos aeroportos da Argentina sobre alegação de serem “falsos turistas”, embora a maioria tenha documentação correta para estar naquele país, seja como turista ou estudante. Que a política econômica de Javier Milei, o presidente da Argentina, está massacrando a população todo mundo sabe. Mas agora isto está afetando e trazendo insegurança também para os brasileiros. Inclusive londrinenses.
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O londrinense Victor Reale, 34 anos, mora há dois anos na Argentina, onde cursa Medicina. E agora ele diz que a situação está “instável”. “Confesso que tenho muita insegurança, principalmente por ser estrangeiro nesta época em que as coisas estão instáveis”, diz. Ele se agarra ao fato de que tem todos os documentos exigidos pelo governo argentino para ser residente lá. “Alguns critérios de acesso a universidade mudaram, quem se inscreveu antes da mudança de governo ainda não foi tão afetados, porém quem tem a intenção de vir agora vai enfrentar muito mais dificuldades”, afirma. Uma delas é que, segundo ele, é a exigência de espanhol nível avançado. “Antes, se exigia um nível de espanhol médio”, conta.

Segundo ele, a vida também não anda nada fácil para a população argentina. “Quando cheguei aqui tínhamos muitos subsídios do governo que auxiliavam a permanência nos estudos, principalmente um transporte público acessível, com um preco equivalente a 10 por cento do que é pago no Brasil. Esses subsídios foram todos cortados pelo novo governo. Isso acaba impactando diretamente os estudantes, nao é incomum ver alunos da Universidade reclamando nos grupos de WhatsApp, que vão ter que faltar as aulas pois não tem dinheiro para chegar até lá”, afirma.
Victor optou por fazer a faculdade no país porque a universidade é pública e gratuita, tem um excelente ranqueamento internacional, inclusive com ex-estudantes ganhadores de Prêmio Nobel. “Além disso, o processo seletivo é mais acessível e menos excludente que no Brasil. Aqui não tem vestibular, a universidade é livre e seu acesso é literalmente universal. Quem quiser estudar estuda”, diz.
Argentina sofre com a inflação
Para se manter na faculdade, que é de período integral, ele conta com a ajuda da mãe e de alguns bicos que faz como acompanhante terapêutico. Mas sua situação, que era razoável até o ano passado com o Real valorizado sobre o peso argentino, está mudando. “Desde que eu cheguei aqui na Argentina, tenho visto uma instabilidade econômica com muita inflação! Só para fazer um comparativo: o valor das empanadas (um salgado popular daqui), quando cheguei na Argentina, era de 45 pesos, hoje está 550 pesos. Em minha vivência e conversando com pares, amigos da faculdade, comerciantes, noto que o poder de compra das pessoas está cada vez mais baixo, estão precisando adaptar-se a nova onda preços, mudar cardápios, abrir mão de determinados confortos para conseguir segurar as pontas”, aponta.
“É como se meu salário do trabalho tivesse sido reduzido pela metade. Quando há aumento, não acompanha a inflação e isso desanima bastante a gente. Subiram os preços de cesta básica, aluguel, transporte, cortaram vários subsídios do governo (conta de luz, gás, transporte). Por sorte, o povo latino-americano é muito trabalhador e, para conseguir sobreviver, acaba fazendo trabalhos extras. Cada um da seu jeito como pode, mas que o poder econômico da população diminiu de forma generalizada, isso é um fato. E quem acaba sendo mais afetado diretamente por isso, em regra, são sempre os mais pobres”, revolta-se.
Ele acredita que a situação chegou em um ponto do qual não tem muito mais espaço para piorar. Mas se piorar, a coisa pode ficar feia por lá. “O povo está cansado, as coisas tem limite. Acredito que se piorar mais do que já está, vai haver consequências de instabilidade política, o que, consequentemente, vai causar mais instabilidade econômica. Existe um limite para a paciência do povo, quando esse limite chega na cesta básica, existe também uma resposta popular. O que vejo diariamente aqui em Buenos Aires sao protestos contra a atual gestão. Protestos que, na maioria das vezes, são efetivos na garantia de manutenção de direitos. Muitas propostas do atual presidente não seguiram adiante devido a esse clamor popular”, afirma.
“Acredito que se o povo continuar resistindo e brigando pelos seus direitos, a partir dessa perspectiva, pode sim existir uma melhora com o tempo. Porém, contar com o sucesso da atual gestao, seria uma ingenuidade da minha parte, já vivi o Bolsonarismo no Brasil e existem muitos pontos dentro da pauta econômica que partem do mesmo princípio ideológico e que, na prática, já se mostraram falhos. Não dá dá para esperar um resultado diferente de um modelo que já se mostrou fracassado”, afirma.
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