Violência policial no Brasil: um problema persistente sob os holofotes recentes

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Por Luiz Joia

Nas últimas semanas, casos de violência policial voltaram a ocupar as manchetes no Brasil, reacendendo um debate que mistura Direito, Segurança Pública e Direitos Humanos. O fim de novembro e o início de dezembro de 2024 foram marcados por episódios, em diferentes estados, nos quais ações de agentes de segurança pública resultaram em mortes, abusos de poder e forte reação popular. Essas situações levantam questões urgentes: até onde vai o uso legítimo da força pelas polícias? E como lidar com os excessos que colocam em risco a vida de civis e a credibilidade das instituições?

O aumento dos casos e a repercussão recente

Entre os episódios mais emblemáticos do período, destaca-se a operação policial em uma comunidade periférica do Rio de Janeiro, que resultou na morte de oito pessoas, incluindo jovens que não tinham ligação comprovada com atividades criminosas. Segundo relatos de moradores e investigações preliminares, os agentes entraram atirando, sem aviso ou tentativa de diálogo, configurando o que muitos chamam de execução sumária.

Outro caso ocorreu em São Paulo, onde câmeras de segurança flagraram policiais agredindo um homem já rendido e algemado. O vídeo gerou indignação nas redes sociais e levou a investigações internas na corporação. Esses episódios não são isolados: dados recentes do Fórum Brasileiro de Segurança Pública apontam que o Brasil registrou mais de 6.000 mortes decorrentes de intervenções policiais em 2023, um número que coloca o país entre os líderes mundiais nesse tipo de violência.

O que diz a Lei de Abuso de Autoridade?

A Lei de Abuso de Autoridade (Lei nº 13.869, de 5 de setembro de 2019) é uma das principais ferramentas jurídicas para combater excessos cometidos por agentes públicos, incluindo policiais. Essa lei tem como objetivo coibir ações que ultrapassem os limites legais e que violem os direitos fundamentais de cidadãos. Ela estabelece como crimes diversas condutas abusivas, impondo penas que vão desde multa até reclusão, dependendo da gravidade do ato.

Entre as práticas proibidas pela lei, destacam-se:

  • Submeter qualquer pessoa a constrangimento ilegal (Art. 9º): Isso inclui situações como forçar confissões por meio de violência ou ameaças, prática infelizmente ainda comum em algumas abordagens policiais.
  • Executar prisões ou buscas sem amparo legal (Art. 10 e 22): Agentes não podem realizar prisões arbitrárias ou entrar em domicílios sem ordem judicial, salvo em situações previstas pela Constituição, como flagrantes.
  • Deixar de identificar-se como autoridade durante abordagem (Art. 23): É obrigatório que o policial se identifique de forma clara ao abordar um cidadão, garantindo transparência e segurança.
  • Praticar violência física ou moral contra presos ou pessoas sob custódia (Art. 13): Agressões, humilhações e tortura são terminantemente proibidas, mesmo contra suspeitos de crimes graves.

A lei também prevê punições para agentes que falsificarem provas, retardarem investigações ou usarem sua posição de poder para prejudicar ou intimidar alguém injustamente.

Embora a Lei de Abuso de Autoridade represente um avanço no combate a práticas abusivas, sua aplicação ainda enfrenta desafios. Muitos casos acabam sendo arquivados por falta de provas ou pela dificuldade em responsabilizar agentes que contam com proteção institucional. Além disso, há um persistente receio de que a lei possa ser usada para intimidar policiais no exercício de suas funções legítimas. É importante destacar, no entanto, que a legislação não busca enfraquecer a atuação policial, mas sim garantir que ela seja exercida dentro dos limites da legalidade.

O papel do Ministério Público, do Judiciário e da sociedade

Diante de episódios de violência policial, o Ministério Público é peça-chave no processo de responsabilização, pois cabe a ele investigar e, se necessário, denunciar agentes que tenham cometido abusos. A Lei de Abuso de Autoridade oferece uma base legal sólida para essas investigações, mas é necessário que as denúncias sejam levadas adiante de forma eficiente e imparcial.

O Judiciário, por sua vez, precisa garantir que as condenações sejam aplicadas quando os abusos forem comprovados. Em muitos casos, câmeras de segurança, depoimentos de testemunhas e laudos periciais são instrumentos cruciais para confirmar as violações e responsabilizar os culpados. No entanto, a ausência de mecanismos como câmeras corporais em larga escala nas polícias brasileiras ainda dificulta o controle das ações dos agentes.

A sociedade também desempenha um papel essencial. Mobilizações populares, protestos e a pressão pública têm sido fundamentais para dar visibilidade a casos de abusos. As redes sociais, em particular, tornaram-se uma ferramenta poderosa para denunciar excessos e cobrar respostas das autoridades. No entanto, é preciso ir além da indignação momentânea e exigir reformas estruturais que previnam novos episódios de violência.

Reflexão e caminhos contra a violência policial

O combate à violência policial no Brasil exige um esforço conjunto de autoridades, instituições e sociedade civil. A Lei de Abuso de Autoridade deve ser aplicada com rigor, garantindo que agentes que violam a legalidade sejam responsabilizados e que suas ações sirvam de exemplo para coibir novos abusos. Ao mesmo tempo, é indispensável investir em treinamento policial, equipamentos modernos – como câmeras corporais – e uma cultura institucional que priorize o respeito aos direitos humanos.

Segurança pública não se faz com violência desmedida, mas com inteligência, diálogo e políticas preventivas. Enquanto o Brasil não enfrentar essas questões de maneira séria e integrada, continuaremos a ver vidas ceifadas e uma sociedade cada vez mais dividida entre medo e indignação.

Luiz Felipe Barros Joia

A violência policial voltou a ocupar as manchetes dos jornais. E isso levanta questões urgentes que precisam ser debatidas

Advogado, formado pela PUC/PR, inscrito na OAB/PR 102.266, apaixonado e atuante no direito criminal e penal desde sua formação, possuindo também especialização em Direito Eleitoral e Direito Empresarial na Era Digital. Músico nas horas vagas. Me siga no Instagram @advluizjoia @luizjoia e visite meu site luizjoiaadvogado.com.br para mais informações.

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