Por Ana Paula Barcellos
Acordar em Londrina com o sol já alto é quase uma afronta. Às seis da manhã, a claridade invade as frestas da cortina e se achega nos meus lençóis com uma insistência que parece um aviso — você não tem escolha, o dia já começou. É como se o próprio universo estivesse fazendo questão de ressaltar que a noite, com suas promessas de descanso, se tornou mera formalidade. A luz solar invade o quarto e me rouba meus últimos e preciosos 45 minutos de sono, como um ladrão que surrupia todos os minutos do modo soneca.
Vivemos em tempos em que a intensidade do sol parece aumentar a cada dia, e não, não é só impressão. Londrina, com seu calor marcado, se transforma numa sauna a céu aberto. Difícil pensar que um ambiente tão acolhedor possa ser, ao mesmo tempo, um malvado que nos obriga a acordar antes dos pássaros. O que deveria ser um ritual suave de despertar se transforma numa fuga da luz que não pede licença. A sensação é de que o dia se impõe e a cama, com seu aconchego, se torna uma armadilha.
Me lembro que resgataram o horário de verão da gaveta e logo isso deve mudar, pelo menos por alguns meses a gente ganha da luz. Se, por um lado é chato acordar uma hora antes, por outro a gente ganha em qualidade do sono – que sonho! E a gente ainda ganha de brinde as tardes alongadas. Ao adiantar os relógios, conseguimos um tempo extra. As noites se alongam e, com elas, as possibilidades. Você caminha pela calçada às 18h sem tanta pressa porque tem gente conversando na rua, o Calçadão iluminado também ganha mais movimento. Adoro esses momentos em que o dia se recusa a acabar, insinuando que há mais tempo de vida, riso e música lá fora.
Ouvia ontem no rádio do motorista que a maioria das pessoas entrevistadas detesta o horário de verão. Nao consigo entender! Se a gente já é obrigada a acordar tão cedo, que ao menos possamos nos recompensar com a extensão da noite. É um jogo de troca, quase um acordo com a natureza. O sol compensa a luz que nos obrigou a encarar logo cedo entregando mais horas de deleite e descanso.
Sim, é verdade que alguns podem ter a queixa da adaptação ao novo horário e a preguiça de lidar com a mudança, mas a vida é feita dessas transições. E, se de um lado temos a luz que desponta antes do que gostaríamos, do outro, temos a possibilidade de esticar o dia e aproveitar momentos que a rotina nos tenta arrancar.
O horário de verão lembra um pouco como é viver a vida fora da rodinha do rato, da bolha cotidiana. Enquanto ele não chega para eu dormir melhor e aproveitar as cigarras cantando às 19h sentada na cadeira daquela calçada, vou me virando com uma máscara de dormir. E deixando as cortinas mais fechadas, o ventilador ligado mais forte, puxando o lençol mais pra perto da cabeça… Morfeu me abrace!
Ana Paula Barcellos
É graduada em História pela UEL, Mestre em Estudos Literários, integra coletivos culturais da cidade e é agente cultural. Sacoleira e brecholenta, trabalha com criação de joias artesanais e pesquisa de tendências, e escreve também a coluna de Moda deste jornal. Siga os Instagram @experienciasdecabide e yopaulab
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