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Meu Extraordinário Encontro com Preta, a Gata

Por André Luiz Lima

Na Arte dos Encontros não temos paradas, é um contínuo ir de momentos que nos ajudaram a chegar até aqui; sabemos que todos os acontecimentos são importantes. A atenção aos detalhes sempre esteve presente em minha vida, abrindo portas para diversos olhares, e assim vamos montando nosso quebra-cabeça.

Para falar sobre meu encontro de hoje, trago à memória os momentos de infância compartilhados com os animais, que denomino de delicadezas e afetos. Esses foram cruciais para o meu desenvolvimento humano. Ao ver um cachorro na rua, eu ficava perplexo com o abandono. Quando algum animal estava ferido, levava para casa; se fosse necessário, improvisava uma tala na perna do animalzinho e aliviava sua dor. Era como se todos compartilhássemos este espaço.

A empatia em relação aos animais é uma extensão da empatia humana, reconhecendo que eles merecem consideração como seres sencientes, capazes de sentir dor, prazer e emoções, sinalizando uma evolução moral. Divido agora meu extraordinário encontro com Preta, a gata representando aqui os animais na inter-relação entre seres humanos, animais e a natureza, algo que remonta à ancestralidade. Isso é o que move toda a existência no universo, desconstruindo definições e crenças que muitas vezes limitam o entendimento e a percepção da vida.

Preciso respirar para compartilhar algo tão íntimo.

 Vamos lá: Anteriormente, mencionei nos relatos dos encontros que, ao escrever, presto atenção na história que se apresenta. Desta vez, não foi uma mão que se levanta, mas sim uma pata, olhando para mim com um “miau”! Quando percebi, Preta minha gata se manifestou, e decidimos resolver isso com gentilezas, afetos e muitos agradecimentos. Não tínhamos nos despedido formalmente antes de sua partida.

Acervo pessoal

Meu encontro tão especial e inesperado ocorreu enquanto contemplava o céu em silêncio, naqueles momentos em que não sabemos muito o que fazer em relação a algumas situações da vida. Não demorou até ouvirmos o mesmo chamado que ouço agora: um “miau” de um filhote de gato tateando o mundo a ser descoberto, no meio de suas fragilidades, entregue à sorte de um quintal qualquer. “Por sorte, esse ‘quintal’ era o quintal da minha mãe e meu, e, para ser sincero, estávamos no mesmo barco.” 

Acervo pessoal

Preta mais dois

Preta veio como um anjo enviado, com seu pelo negro lindo, olhos verdes, movimentos elegantes e rápidos. Levou um tempo para ela entrar dentro de casa, então deixávamos comida, água e a porta sempre aberta para que pudesse entrar quando confiasse. Até que chegou o dia; eu estava sentado no sofá da sala, ela entrou, eu fiquei observando seus movimentos como se nada estivesse acontecendo. Ela subiu no sofá, olhou para mim e fez “miau”! Agora, não éramos apenas dois, mas três.

Dizem que três é o número do equilíbrio, da união e da perfeição, um número considerado sagrado em nossa sociedade. É também um número de tempo (passado, presente e futuro; princípio, meio e fim) e está presente em muitas histórias que todos conhecemos, assim como esses felinos considerados sagrados.

Na Arte dos Encontros, conto as histórias dos aprendizados, expresso minhas emoções, que me ajudaram a ser quem eu sou hoje. Nesse período, minha mãe lidava com suas fragilidades emocionais devido a uma enfermidade que a acompanhava há alguns anos e não queria ter outro animal com receio de mais perdas. Mas a gata veio e foi aceita imediatamente. Agora, éramos mais fortes: eu, minha mãe e a gata.

Acervo pessoal

Preta foi se adaptando ao lar, e as coisas mudaram por ali. O afeto e o silêncio desses animais são os mistérios que fazem as pontes do que não conseguimos ver, mas conseguimos sentir. Nesses 10 anos de convivência, esse encontro me ajudou no cuidado com a minha mãe, tornando os dias mais coloridos, e a presença desse ser foi tão terapêutica que a falta de afeto escondido e não processado em meio a perdas e abandonos foi dando espaço para novas interpretações e exposição de sentimentos tão íntimos.

Uma boa risada, ou mesmo as reclamações das travessuras felinas, deram vida ao cotidiano, transformando desafetos em amor incondicional. Como eu passava muito tempo fora, Preta era a segurança da casa, e eu me sentia tranquilo. Dividimos momentos de risadas, de unhadas, de levar para o veterinário, de enganar para tentar cortar as unhas, os sofás destruídos, o afago das mãos nos pelos que ficavam espalhados pela casa, a ração que não aceita, o sumiço das madrugadas, o pássaro que traz na boca e entrega de presente, os bibelôs quebrados, a entrada do cio, os gatinhos que chegam, as despedidas para as doações com algumas lágrimas, o sumiço dentro do guarda-roupas ou dentro da máquina de lavar que levava horas para encontrar com um certo desespero até se enfiar no meio das cobertas e dormir o sono dos justos, é claro.

Na A Arte dos Encontros, expresso minhas emoções que me ajudaram a ser quem sou hoje. Preta, a gata, faz parte dessas emoções
Acervo pessoal

A vida estava em movimento, e quando uma dor no corpo aparecia, Preta deitava para aliviar essa dor. Todos cumprimos nosso papel mágico na Arte dos Encontros. Minha mãe pôde transmutar alguns sentimentos adormecidos, eu me senti mais protegido e em equipe, conseguindo realizar tarefas com mais facilidade.

Natalina, minha mãe, um certo dia se despediu e virou estrelinha. Preta ficou um tempo entre nós com seu cuidado invisível, levantando suas patas para que quem estivesse no entorno pudesse ver e o coração sentir, que a falta de sensibilidade para os vários olhares se mescla com a mesma consideração “é apenas um animal”.

Enfim! Preta, um certo dia, fechou seus olhos verdes e também virou estrelinha, como se estivesse me dizendo: “segue, André, caminha, caminha, agora é com você”. E nesse caminhar cheio de artes e encontros, deixo aqui a seguinte reflexão.

A prática de maus-tratos aos animais muitas vezes reflete uma falta de compreensão sobre a natureza desses seres e, em alguns casos, pode ser um reflexo de desequilíbrios sociais e emocionais. A integração de conceitos como empatia, compaixão e responsabilidade pode contribuir para uma mudança positiva na relação entre humanos e outras espécies. Além disso, é importante reconhecer que os animais não devem ser tratados como válvulas de escape para as carências afetivas humanas. Eles têm suas próprias necessidades, desejos e direitos, e a responsabilidade de cuidar deles vai além de simplesmente suprir nossas próprias necessidades emocionais.

O respeito pelos seres vivos, independentemente de sua espécie, é um reflexo de nossa própria humanidade. Devemos fazer a nossa parte e contribuir na educação da sociedade para realmente ter um mundo muito melhor. Depende de nós!

Essa pata que se levantou se une às mãos que se levantam todos os dias ao nosso lado, às vezes pedindo ajuda, um olhar, um afeto. São esses pequenos detalhes que transformam vidas na Arte dos Encontros.

Eu muitas vezes levanto as minhas.

Saudade!

As fotos não são de Preta, mas de uma gata de uma amiga minha que mora na Itália.

André Luiz Lima

Londrinense, ator, diretor, professor, palestrante e produtor cultural. Siga os Instagrans de André@allconnecting @aondevaiandre

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(*) O conteúdo das colunas não reflete, necessariamente, a opinião do O LONDRINENSE.

Foto principal: Freepik

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4 Comentários

  1. Mais uma vez a sensível e transparente escrita reverbera ao redor! Grata

  2. En el alma de un gran artista, siempre hay grandes inspiraciones,amores,y sentimientos y cuando fluye se transforma en poema quizá relatos dignos de aplausos, para Andre Lima tiro literalmente mi sombrero! Oleee…!!! JC

  3. Lindo texto pela sensibilidade do tema e importância da reflexão sobre as semelhanças entre o reino animal e humano. Parabéns, André!!

  4. Primeiramente achei a pauta super relevante considerando a importância que os animais têm na vida de todos no geral e em relação a nos mostrar a essência da companhia, da leveza nas relacōes além também da incondicionalidade, pois se prestarmos atenção, nos ensinam muito. Pensar sobre o papel dos animais também nos mostra como estamos mais individualistas em relação as nossas feridas adquiridas em relações disfuncionais nos fazendo buscar o isomamento como uma forma de não mexer na ferida nos enclausurando com nossos pets e deixando as relações com nossos semelhantes para lá. Porém isso faz com que ocorra uma sobrecarga sobre o papel do animal se considerarmos que passa a ser colocado em papeis que nao deveria estar. A polaridade contrária também acontece, o número assustador de animais abandonados precisando de acolhimento e muitos optando por comprar animais de raça. Logicamente que o livre arbitrio de cada um deve ser respeitado em relação a não querer adotar. Mas não dávpara ignorar que isso ocorre. Outro ponto é o descarte dos animais sem a menor responsabilidade e ainda há o lado dos maus tratos que os animais são submetidos. Acredito que temos muito a evoluir nesse sentido e precisamos rever e fazer a autocritica para perceber como nossos comportamentos reverberam nos outros seres pois independente da espècie, tudo está conectado e somos todos extensão uns dos outros. Parabéns pelo texto André. Tenho certeza que sua Estrela felina Preta está orgulhosa de você ! Nunca é nem será apenas um animal para quem consegue ver além!

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