Por Suzi Bonfim
Uma imersão pessoal na 8ª edição da série Palcos Musicais foi um encontro com a genialidade de alguns músicos brasileiros, alguns tão próximos e pouco conhecidos pela maioria dos paranaenses, que é inacreditável. Como assim, tanto talento com produções autorais da mais alta qualidade, sem o devido reconhecimento do público, dos meios de comunicação e do Poder Público?
Foram 14 dias de espetáculos – entre 11 e 24 de maio – em diversos espaços de Londrina. Com um novo formato, a série, que completou 10 anos em 2023, concentrou as apresentações em um mês, de graça ou com ingressos a preços acessíveis e diferentes opções para o espectador, possibilitando mais proximidade com os músicos e ao ar livre, por exemplo. Um público mais exigente pós-pandemia, segundo a coordenadora geral e artística da mostra Irina Ratcheva.
Assistir a cinco shows foi um prazer e a experiência em três deles, com o piano ao mesmo tempo, protagonista e coadjuvante, foi especial. Sou leiga no assunto. Ouvir a música, sentir o coração palpitar e o corpo vibrar é o que me faz expressar o que penso com certa ousadia!
As atrações nacionais (que vi), evidentemente, foram mais prestigiadas, talvez pelo simples fato de serem de outro lugar e de renome. A abertura com o grupo Pianorquestra , indicado ao Prêmio da Música Brasileira 2023 e conhecido internacionalmente, foi de tirar o fôlego: cinco músicos, dez mãos às vezes tocando juntas no teclado, com coordenação, sincronia e versatilidade sem precedentes, transformam um instrumento em uma verdadeira orquestra. Um espetáculo de conhecimento técnico, afinidade, sintonia, cumplicidade e muito mais, onde até o público no cine teatro Ouro Verde participou.
Depois da apresentação, o grupo mostrou como é o processo de criação inovador e único para o público. O fundador e diretor artístico do Pianorquestra, Claudio Dauelsberg, me explicou que a ideia surgiu na universidade quando todos ainda eram alunos e não há nada similar que ele tenha conhecimento no mundo. “É um trabalho brasileiro, formato brasileiro, de muita pesquisa. Uma brincadeira muito complexa, de sincronia, de conjunto que a gente respira junto, se olha e o mais bacana é que a gente se diverte fazendo”, garantiu.

Ainda do cenário nacional, o casal Kay Lyra e Maurício Maestro prestou homenagem aos 65 anos da Bossa Nova e aos 90 anos de Carlos Lyra – pai de Kay e um dos fundadores deste gênero musical brasileiro que conquistou o mundo.
Uma viagem sonora/afetiva com clássicos como “Águas de Março”, de Tom Jobim, e “Chega de Saudade”, de Tom e Vinícius, “Minha Namorada”, “Você e Eu” e “Primavera”- e algumas pitadas de histórias dos bastidores contadas por Kay que conviveu com as estrelas deste gênero musical brasileiro.

Mas foram as atrações londrinenses – que tive oportunidade de conhecer depois de mais de 35 anos longe do cenário cultural da cidade – que marcaram esta série. A qualidade das produções na interpretação de clássicos da música popular brasileira instrumental e das composições autorais são a prova cabal de que estamos cercados por grandes músicos.

A apresentação do Clube do Choro de Londrina, no final da tarde de domingo (21), no Museu Histórico, foi perfeita. O grupo, formado pelos músicos Lucas Fiuza (cavaquinho/bandolim), Guilherme Villela (cavaquinho/bandolim), Osório Perez (violão 7 cordas aço), Júlio Erthal (flauta transversal/saxofone) e André Vercelino (percussão), faz um passeio pelas composições autorais de chorões londrinenses de ontem e de agora, mesclando com músicas de compositores do país. Um dos fundadores do Clube do Choro, Alberto Barrozo Soares, falecido no início do mês foi homenageado pelo grupo.
Na plateia, famílias inteiras, pessoas de todas as idades. Porém, muito mais gente poderia ter compartilhado este momento de nostalgia e beleza: gratuito, som de qualidade, cenário e clima ideais. O que será que faltou? Divulgação, com certeza, não foi.
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Também aberto ao público, no espaço cultural da AML (Associação Médica de Londrina), na terça-feira (24), o cantor e compositor Casimiro ao lado do pianista Fabricio Martins surpreenderam no show autoral intitulado “Precisamos falar sobre gente ruim”. O tema – em princípio sem nada haver com musicalidade – foi a inspiração de Casimiro, médico que estudou psiquiatria por algum tempo e fez uma pesquisa nas redes sociais sobre “Você já foi vítima de um psicopata?”. Boa parte das respostas está nas letras das músicas do show.
Casimiro, em entrevista ao Londrinense POD, garantiu que ninguém ia sair triste dali. Com certeza, ao contrário, saí do espetáculo com a sensação de ter visto uma “conversa” harmoniosa de letra e música. A melodia das composições de Casimiro foram repassadas por meio de áudio para o Fabrício que fez os arranjos e o resultado toca diretamente no coração pela suavidade e emoção que transmite. A música Nena, em homenagem a tia do cantor, é um dos exemplos.

No encerramento da série Palcos Musicais, o Duo Clavis, instrumentistas Marcello Casagrande (vibrafone) e Mateus Gonsales (piano) apresentam a produção dos álbuns, Time Lapse (2021) e Magia Instrumental (2022) e arranjos próprios de músicas de Paulo Braga, Luiz Bueno, Chick Corea, Brad Mehldau, Beatles.
Os dois londrinenses, que atuam na área acadêmica e diversos projetos, shows, CDs de música instrumental brasileira, têm um trabalho extremamente criativo em que o improviso é uma constante. A coordenação de Marcelo no vibrafone com quadro baquetas nas mãos é um habilidade que eu gostaria de ter (já deu pra perceber que é um ponto fraco meu). O instrumentista falou sobre a produção do Duo Clavis no O Londrinense POD.
Talvez, por ser uma quarta-feira (24), o número de pessoas no show foi reduzido. Aí, de novo, é preciso dizer que quem não foi, perdeu uma oportunidade de apreciar o som instrumental produzido por quem está bem aqui na cidade de Londrina, terra de estrelas que todo mundo tem que conhecer. Por mais Palcos Musicais, como este!
fotos: assessoria PalcosMusicais/redes sociais

Suzi Bonfim
Jornalista, formada na UEL, por quase 30 anos morou em Cuiabá -MT. De volta a Londrina-PR, vive a fase R de reencontros e renovação, respirando novos ares. Escreve sobre o que acredita por um mundo melhor. Instagram @suzi.bonfim