Por Ana Paula Barcellos
Nos últimos dois meses, percebi uma queixa em comum vindo de pessoas diferentes, de grupos diferentes de amigos. A questão: “Não consigo usar determinadas peças de roupa em Londrina, não tenho coragem. Adoro essas peças, mas fica todo mundo me olhando como se fosse estranho.”
Não ouvi isso de duas pessoas, ouvi isso de sete pessoas. Juro juradinho! Gente que prefere não usar determinadas peças porque as outras pessoas, que estão no Calçadão ou no shopping, por exemplo, vão ficar olhando.

Eu entendi exatamente o que elas queriam dizer. E vamos falar sinceramente, quem nunca? Eu mesma já deixei de usar roupas que chamariam mais atenção, por exemplo, e eu não estava com bom humor suficiente para lidar com olhares indiscretos naquele dia.
Ao mesmo tempo, não poder usar determinadas roupas porque as outras pessoas vão ficar olhando ou julgando, é uó, né? Por que isso acontece?
Bom, primeiro a gente precisa ser muito sincera sobre a cidade em que a gente vive (e que eu amo de paixão): mesmo crescendo, mesmo sendo uma cidade de médio porte, Londrina ainda tem uma vibe interiorana muito forte. E em relação a tudo: a forma como as pessoas dirigem os carros (e que é terrível, fala sério!), a forma de lidar com as outras pessoas, os preconceitos típicos… Londrina, apesar de tudo de bom que possui, ainda é um fazendão iluminado.

Eu já morei fora. Morei um ano no ABC Paulista e um tempinho em Rio Cuarto (Córdoba, Argentina). As cidades da região metropolitana de São Paulo são menores, mais aconchegantes (adorei morar em Ribeirão Pires!), mas também trazem consigo uns “quês” da capital. Fui menos importunada na rua (com cantadas e assédio) e ninguém nunca reparou na roupa que eu estava usando! A única vez que prestaram atenção em uma roupa minha foi quando uma moça queria saber onde eu tinha comprado o vestido que estava usando.
Na Argentina, a mesma coisa. E olha que Rio Cuarto também é interiorana! Tem cerca de 200.000 habitantes e todos os vizinhos se conhecem de “mil anos”. Ainda assim, coisa mais difícil era levar cantada ou receber olhares, fossem indiscretos ou curiosos, por causa da roupa que estava usando.

Mas em Londrina isso é real. Se eu saio com uma roupa considerada muito ousada ou diferente, vou receber pelo menos alguns olhares curiosos. Se o decote for mais profundo ou a saia mais curta, vou ser incomodada por cantadas e olhares de homem me engolindo.
Uma das pessoas com quem conversei, e que não tem coragem de usar determinadas peças de roupas quando está na cidade, diz que em Curitiba é completamente diferente – e é mesmo, sei disso.
E isso só fez aumentar o número de pulgas atrás da minha orelha. Por que raios a gente aqui de Londrina ainda se importa tanto com as roupas que os outros usam? Por que a gente não consegue evoluir nesse sentido?
Pensando sobre isso, ainda me lembrei de quando vou de pijama ao mercado. Ficam olhando mesmo! Mas eu, nem aí. Certo dia, num inverno, trombei uma senhora de uns 60 anos usando pijamas também. Nos olhamos e sorrimos. A roupa que alguém usa deveria ser das coisas menos importantes. Por que ainda somos tão impressionáveis e ligados à “imagem”? Que diferença a roupa que a outra pessoa usa faz na nossa vida?

Fica aí a reflexão. É muito ruim ter que ficar controlando o que a gente veste pensando nos outros, na opinião dos outros. Eu mesma, agorinha, percebi que na adolescência não dava a mínima pra isso, vestia o que dava vontade, independente do que ia enfrentar na rua. Saudades dessa ousadia juvenil!
Fica o desafio pra mim também. Quais são as peças que não uso porque não quero enfrentar os olhares e opiniões das ruas da Filha de Londres? Hora de mudar isso aí!
Vou fazer uma série sobre isso, e podem esperar que logo vou pra rua pra tentar entender “mais de perto” essa questão.

Ana Paula Barcellos
Viciada em botas, sacoleira e brecholenta, trabalha com criação de joias artesanais e pesquisa de tendências. Tem foto da Suzy Menkes na estante e escreve essa coluna usando pijama velho, deitada no sofá enquanto toma café com chocolate.