Parto natural ou cesariana: 1 decisão da mãe

WhatsApp Image 2023-04-30 at 10.22.47

A mulher é amparada por lei para garantir o direito de ter um acompanhante e a presença da doula, independente da forma como vai dar à luz

Suzi Bonfim

O LONDRINENSE

Para uma mulher, o ato de gerar um ser, parir ou dar à luz, é envolto de uma série de mitos que ao longo dos anos foram se modificando. O parto natural, normal ou vaginal, foi a forma como muitas gerações nasceram e ainda nascem. Mas, na era moderna, este procedimento perdeu espaço para o parto cesariana, que, geralmente, tem data e hora marcadas para ser realizado, principalmente entre as mulheres de maior poder aquisitivo.  O Brasil é um dos países com maior índice de parto cesariana por acarretar “teoricamente” menor sofrimento para a mãe, dependendo do ponto de vista.

Mas a atuação da doula, uma ocupação reconhecida pelo Código Brasileiro de Ocupações (CBO), sob o número 3221-35, e com tramitação e regulamentação da profissão em nível nacional, está ganhando mais atenção da sociedade. O apoio às mulheres na hora do parto, seja ele natural ou cesariana, já é realidade em alguns estados, como o Paraná (Lei Estadual 21.053/2022).  Este suporte está inserido no que se define como a humanização do parto, um contraponto à violência obstétrica com casos relatados em todo o país.

Tamires Medeiros, doula há quatro anos, explica que houve uma transição na escolha do parto pelas gestantes. “Das parteiras, que passavam o conhecimento de mãe para a filha, e realizavam os partos em casa, com altos índices de mortalidade materna e de bebês; aos partos realizados nos hospitais com medicamentos e os aparelhos no centro cirúrgico, até o parto cesariana, em que se paga para não sofrer”, diz a doula.

Para Tamires, não faz sentido relacionar a dor do parto à sofrimento. “Você tá fazendo uma pessoa  inteira. E não tem como passar por este processo sem sentir nada. O parto normal tem suas vantagens fisiológicas, mas tem sim, a dor do parto, só que dor é uma coisa, sofrimento é outra”, reforça. Tanto no parto normal quanto no parto cesariana, existe dor. “A cesariana é um processo cirúrgico, tem os seus riscos, tem o pós-operatório. Então, a mulher, na verdade, precisa estudar os prós e os contras pra realidade dela, o que ela sonha para que este momento possa ser feito da melhor forma possível”, pondera a doula.

Papel da doula no parto natural ou cesareana

A palavra doula, tem origem na Grécia e quer dizer “mulher que serve”, ou seja, ela dá  suporte na gestação, auxilia física, emocional e tecnicamente as futuras mães antes, durante e pós-parto, seja normal ou cesariana.

“Nosso trabalho é informativo, de preparo psicológico e físico. Acompanhamos a gestante desde o começo da gravidez, explicando a fisiologia do corpo feminino, do parto, o que está acontecendo com o bebê na barriga dela, preparando o casal ou o acompanhante que vai estar na hora do parto.

O que é normal ou não, neste processo? O que acontece na cirurgia: o bebê nasce, o obstetra entrega o bebê para o pai que vai para o berçário acompanhar os exames no filho. A mãe fica ali, no centro cirúrgico gelado, sozinha, sem saber o que está acontecendo”, relata,

Neste caso, o papel da doula no centro cirúrgico é de conversar com a mulher enquanto os procedimentos estão sendo feitos; colocar uma música, desligar o ar condicionado, mas a principal, colocar o bebê junto da mãe. Quando é possível, a doula já põe o bebê pra mamar ali mesmo no centro cirúrgico. 

“Na cesariana, como a mulher está anestesiada, ela não sabe o que está acontecendo. Por isso, nosso principal papel é garantir o primeiro contato da mãe com o bebê, pele a pele, para que ela possa sentir o seu cheirinho. Isso faz muita diferença no desenvolvimento da criança, e são coisas que o protocolo médico não prevê”, diz Tamires.

Doulas, não são parteiras. Este papel, atualmente, é das enfermeiras obstétricas que podem acompanhar um trabalho de parto domiciliar planejado, têm equipamentos para monitorar a mãe e o bebê.

“Elas são as parteiras modernas. A doula, eu brinco dizendo que é a moça da bacia de água quente. Nós estamos lá, na hora do parto, para dar apoio físico e emocional. Nós vamos usar a aromaterapia, massagem,e música para acalmar a gestante. Há doulas especialistas em hipnose, estimulam a movimentação para acomodar o bebê. A gente não faz toque, não ausculta o coração do bebê ou afere a pressão da mãe. Isso é com a equipe médica”, explica a Tamires.

Decidir ter o acompanhamento da doula depende do interesse de cada gestante. Algumas mulheres optam a partir do terceiro mês de gestação, outras, desde quando começam a planejar a gravidez. “Elas entram em contato comigo, vão para um médico bacana para fazer os exames pré-concepcionais, começar a tomar o ácido fólico, medidas importantes quando se sonha em ter um bebê”, destaca.

Direito de escolha do parte pela mulher é garantido por lei

Há ainda uma certa resistência entre a classe médica, principalmente, entre os mais tradicionais em permitir o acompanhamento da doula no parto, de acordo com Tamires Medeiros. “Alguns médicos tradicionais são um pouco mais resistentes, mas tem a lei do acompanhante (Lei Federal nº 11.108), tem a lei da doula (Lei nº 3.367/2022), e aí eu já antecipo para as mulheres que, se o médico é mais resistente, tem a opção de trocar de médico, quando for pelo plano de saúde particular ou se for pelo SUS, em que não há esta opção, vamos nos preparar para fazer um plano de parto, para conseguir o parto que a mãe quer com respeito”, afirma.

O principal receio das futuras mamães é o de sentir dor em função de informações equivocadas sobre o processo.

“Coisas que a gente vê em filmes e novelas, mas não fazem parte da realidade. O parto é um processo fisiológico e quanto mais conhecimento você tem do seu corpo, mais calma você tem, tem a dor, mas sofrimento é opcional. Quando você tá consciente que aquela dor é teu filho que está chegando, cada contração vem e passa e, a cada uma, fica mais  perto de você pegar seu bebê no colo, a gente vai tirando a visão do sofrimento, de que está quebrando os todos os ossos, com a mídia mostra. Nunca vi ninguém morrer de dor no parto. Antigamente, as mulheres morriam por falta de assistência”, justifica.

Outra cena comum nos filmes, que não condiz com a realidade, é aquela em que a bolsa amniótica da gestante estoura e a família sai correndo para o hospital.

“Os estudos mostram que, em média, as mulheres demoram até 24 horas para entrar em trabalho de parto depois que a bolsa estourou. Se estiver tudo sob controle, sem sangramentos, a gestante pode ir para casa comer e esperar pelo menos cinco horas para ir pro hospital. Não é como nos filmes que todo mundo sai correndo, dá tempo”, garante Tamires.

Benefícios do parto humanizado vão dissipando os medos que muitas mulheres ainda têm do procedimento natural. “Ela tem a opção de fazer a cesariana e a gente só orienta que seja no momento que o bebê dá o sinal de que está pronto. Não fazer a cesárea porque é feriado, tem um aniversário, mas aguardar o tempo do bebê”, explica.

Para Tamires, a sensação de dar apoio às gestantes na hora do parto é gratificante. “É incrível, a gente vê que ali, na hora do parto, são curados os medos, nasce uma família, uma história. É muito gostoso ver a relação dos maridos com as mulheres”, analisa.

Participação do pai durante o parto une o casal

Muitos companheiros, segundo Tamires,  não acreditam que  a mulher que ele acha frágil e delicada vai enfrentar o parto. “Quando ele (o marido) vê a mulher parindo, fazendo uma força visceral, fala: gente, esta mulher que achava frágil pariu uma criança. É muito gostoso ver esta transformação. Ele enxerga  a mulher capaz, potente, o marido enxerga a presença dele, ativa na hora do parto e o quanto é bom o contato do bebê com a família. Faz muita diferença esta construção para o casal”, constata.

Para o pai, o momento é mágico, mesmo quando é cesariana.  “Este pai está ali de mãos dadas com a mãe, vê o bebê assim que ele nasce, corta o cordão umbilical, o pai já pega o bebê peladinho, pele a pele, ninguém aguenta”, descreve a doula.

O trabalho de parto normal é demorado, pode durar de 15 a 20 horas. Os estudos apontam que a dilatação de cada centímetro leva em torno de uma hora e meia. “Cada corpo é um corpo. A dilatação não é o principal neste momento.

Há todo um processo pro bebê descer, virar, encaixar. Teoricamente, uma hora e meia para cada centímetro, e é preciso 10 centímetros de dilatação, são quantas horas em trabalho de parto? A gente fala, não se preocupe com a demora, é uma fase. São os prodomos, as contrações que preparam o colo do útero para o parto. Elas podem ser incômodas, mas não são dolorosas e podem começar 15 dias antes do parto”, explica a doula.

O maior benefício do parto natural é que quem avisa que está pronto é o bebê. “É um ato fisiológico, quando o bebê está maduro ele libera hormônio para avisar para o seu corpo que ele está pronto”, ressalta Tamires. Além disso, há vantagens para a amamentação, é mais fácil para o útero voltar ao tamanho normal e reduz os índices de hemorragia pós-parto.

Campanha FURTA COR, no mê de maio, alerta para a saúde mental da mulher 

A maternidade não é um mar de rosas, e por isso, é realizado no mês de maio a Campanha Furta Cor pela saúde mental da mulher. Especialista em pós parto, a doula Tamires Medeiros aponta que a mulher grávida ou linda e feliz com o bebê que se vê nas propagandas, nem sempre é uma verdade.

“Muitas mulheres, já na gestação se sentem muito mal, não se sentem felizes. Muitas têm depressão pós parto, um momento que hoje é  muito solitário. Antigamente, a gente morava mais perto da família, mães e avós estavam mais próximas. Mas, hoje, na forma como a sociedade se organizou, vivemos muito individualmente: homem, mulher e filhos. O marido sai pra trabalhar e a mulher fica sozinha 24 horas com a criança. Quem escuta esta mulher, quem ajuda?”, questiona.

Entre as consequências desta dedicação está o burnout materno, o cansaço. Tamires fala da rotina estressante das mães: “A mãe está 24 horas trabalhando,  ela não tem descanso, tem que amamentar durante a noite, tomar banho e ir ao banheiro com o bebê. Não tem folga. Aí, tem a necessidade de uma rede de apoio, de um olhar para esta mãe. Quem cuida de quem cuida?” lembra Tamires.

Segundo ela, esta é uma das causas de suicídio entre mulheres que são mães. “Há o aumento de suicídio materno, aumento doenças mentais, mães que maltratam os filhos porque não aguentam mais, mas não tem ninguém olhando por elas e é preciso intervir antes que isso aconteça. A campanha neste mês de maio é por políticas publicas para construir este rede de apoio para as mães”, concluí.

Foto: Arquivo pessoal/Instagram @tamiresmedeirosdoula

Leia também : Você sabe o que uma doula faz?

Ouça a entrevista na íntegra no PODSuzi

 

Compartilhe:

Uma resposta

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Anuncie no O Londrinēnse

Mais lidos da semana

Anuncie no O Londrinēnse

Opinião

Vaticano: o perigo do retorno ao conservadorismo

Há um risco real de retrocesso na Igreja Católica com a sucessão do Papa Francisco, que foi um líder progressista, defensor dos pobres e inclusivo com os LGBTQ+, o que gerou forte oposição do conservadorismo mundial. Agora, com a possibilidade de eleição de um Papa conservador, teme-se a reversão dessas conquistas.

Leia Mais
plugins premium WordPress