Por Clodomiro Bannwart
Querido diário!
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Para o prof. Mário Sergio Cortella, “o sertanejo é a herança da nossa apressada urbanização”. Em pouco mais de meio século a população brasileira deixou o campo para se fixar na cidade. No hiato temporal entre o rural e o urbano, restou o melancólico, o saudosismo de um passado mítico, o apego à valores conservados sob a métrica da religião. O sertanejo, que brota do Brasil profundo, sobretudo do Centro-Oeste do país, captura esse sentimento bucólico e, ao mesmo tempo, galhofeiro.
A cada momento surgem novas duplas sertanejas, novos hits, porém, embrulhados em novidades já envelhecidas. O sertanejo retrata um país cativo do passado, lugar comum de muitos políticos e religiosos. É da argamassa desse imaginário não tematizado que brota o mito que reverencia o passado, incapaz de administrar o futuro. O reacionário que recua diante do novo. A caserna que almeja o triunfo da força bruta como se o país fosse um rodeio de interior. O empresário que nega o Estado para negociar na antessala da legalidade. O homem comum que se despe da sua cidadania para firmar-se na turba conduzida por algoritmos, ao som do berrante do menino da porteira, desejoso de fechar as portas da Suprema Corte.
Enfim, o sertanejo canta um país míope e dicotômico. Um país distante de si e dos seus. Um país que nega políticas públicas para a cultura e vende shows milionários para cidades com esgoto a céu aberto. Um país que levanta a bandeira da liberdade para destruir as instituições liberais que, por ironia, são as que garantem e protegem a liberdade. Um país que usa Deus como slogan político para atentar contra os valores mais sagrados da religião. Um país patriota que assalta a bandeira, símbolo nacional, para asfixiar o sentimento de nação. Um país que vangloria-se da pujança do seu agronegócio, da força do homem do campo, e deixa, sem nenhum pudor, trinta milhões dos filhos dessa pátria gentil na linha tênue da indigência, da miséria e da fome.
Mas, como bem expressa a letra da música cantada por Gilberto e Gilmar, “pra todos problemas existe solução” (Segue a letra)
É usar o bom senso e agir com o coração
Ontem fui convidado pelo meu patrão
Para um jantar, na sua mansão
Certa hora mais tarde me chamou do lado
E veio bravo e impôs a questão
Pra não te mandar embora vou ser obrigado a baixar seu salário
É sim ou não?
Aí eu pensei
Tá ruim, mas tá bom
Tá ruim, mas tá bom
Tá ruim, mas tá bom
Aôôô! Toca o modão! IiiiHuuuuu!!!!

Clodomiro José Bannwart Júnior
Professor de Ética e Filosofia Política na Universidade Estadual de Londrina. Coordenador do Curso de Especialização em Filosofia Política e Jurídica da UEL. Membro da Academia de Letras de Londrina.
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