Por Wilson Moreira (*)
A tentativa de um golpe militar deflagrada no dia 8 de janeiro último por apoiadores do ex-presidente da República expôs o que muitos estudiosos da história do Brasil já alertam há muito tempo: Parte da caserna brasileira ainda não se conformou com a redemocratização do país.
O último presidente da República, oriundo das fileiras militares (que, aliás, passou por lá com conduta reprovável), cercou-se de servidores das Forças Armadas em sua gestão. Nem mesmo no regime militar houve tantos militares em postos do governo. A militarização do serviço público federal talvez tenha tido a intenção de produzir um mando hierárquico sem que houvesse contestação alguma, numa lealdade absoluta ao chefe do Poder Executivo.
Ao lado da militarização do governo veio a instalação de uma política ideológica estruturada no ódio à oposição e fundamentada em mentiras. Estruturou-se uma comunicação “oficiosa” instigando medo e terror na população. Não houve um dia no governo passado sem ataques à imprensa, à ciência ou à educação. Conceitos ultrapassados e pretensos valores ditos da família foram amplamente exaltados sem seus devidos fundamentos. O inimigo comunista foi combatido ferozmente, como se ainda estivéssemos na guerra fria. Deus, Pátria e Família foram esculhambados ao bel prazer desses que não suportam conviver com os diferentes.
O caldo da mistura dos que odeiam a democracia e usam fardas com os novos loucos formados por um filósofo que nunca o foi e neopentecostais horrorizados de medo dos comunistas, incitados por seus líderes terrivelmente cristãos, abriram o caminho para o transe nacional que desaguou no 8 de janeiro.
As mentiras sobre as urnas foram alimentadas desde o início do governo. Apenas uma entre tantas circulando nas redes sociais verde amarelas, onde se nega a realidade sem pudor nenhum. Empresários mal informados e mal formados do agronegócio e outros setores engrossaram a turba financiando o medo no seio social.
Embora não sejam poucos os extremistas que vivem num mundo paralelo, ao que parece não conseguiram tutelar a democracia. Fosse fácil seu intento, teriam conseguido neste início de ano e de governo novo. As instituições agiram rápido como deveriam, mesmo com as sabotagens internas de órgãos de segurança que deveriam zelar pela democracia. Foi mostrado claramente que não há mais espaço para golpe no Brasil. Aqueles que pensam o contrário devem rever seus princípios.
Servidores públicos que participaram de alguma forma, facilitando, incentivando, se omitindo e mesmo ajudando os invasores criminosos do dia 8 devem ser chamados a assumir seus atos e devidamente investigados e punidos. Quem detesta a democracia não serve pra ser servidor público.
Eles continuarão por aí a atacar a democracia com as mentiras de sempre. Eles continuarão a incitar o ódio, o medo e o terror. Nossa missão é manter a democracia e fortalecê-la. Que estes que não suportam o conviver democrático, as crenças diferentes ou sequer o pensar diferente sejam iluminados com a ciência, o conhecimento e a solidariedade. De resto só a exemplar punição aos crimes cometidos para servir de exemplo. Embora golpeada, mas não abalada a democracia vencerá.
(*) Policial penal, cientista social e poeta em Londrina
Foto: Arquivo/Agência Brasil