Palavra tão usada atualmente, principalmente em pautas que buscam a equidade social, tem valor expressivo que vai além do dicionário.
O que é ser mulher negra no Brasil? Essa pergunta é colocada em pauta frequentemente pela mídia, quando temos assunto de racismo escancarado, quando temos a proximidade de alguma data comemorativa envolvendo a negritude, por exemplo. Ser mulher negra no Brasil envolve uma rede de temáticas, entre elas a representatividade. A ideia nesta coluna não é ficar trazendo teorias, exemplos abstratos. O propósito é trazer exemplos práticos para que debates tão profundos sejam entendidos. Isso é didática. E no Brasil, quando o assunto é racismo e negritude, é preciso ser didático.
Você já se perguntou o porquê as minorias sociais, como as pessoas negras, têm abordado com tanta frequência tal temática? Você já se perguntou, afinal, o que é a representatividade para a mulher negra?
Abordar a representatividade é entender que vivemos em uma sociedade plural e que essa pluralidade precisa promover a igualdade entre todos. Isso acontece? Não, em plenitude eu diria. É preciso que as pessoas entendam que há indivíduos com identidades e trajetórias diferentes e que eles precisam ser inclusos. E, aqui, estou falando dos negros. Das mulheres negras. Mulheres plurais, com histórias diversas que buscam a igualdade de direitos e, principalmente, o direito ao respeito.
Já dizia Djamila Ribeiro em sua obra Pequeno Manual Antirracista: ser negro no Brasil é tomar ciência disso desde a infância. E isso passa pelo processo de aceitar seu cabelo, seus traços, sua beleza. E, principalmente, entender que o Brasil é um país que gosta de refutar pautas positivas acerca do negro.
Uma pessoa branca não precisa pensar o que é ser branco no Brasil, nem buscar referências sobre sua estética, por exemplo, para refletir: como nosso povo é respeitado e transita facilmente entre todas as esferas sociais. Já para as pessoas negras, esse processo teve início, com afinco, de uns dez anos para cá.
Vou usar um exemplo pessoal para que ocorra a compreensão do tamanho da importância da representatividade na vida da mulher negra.
Hoje, com 36 anos, entendi como é necessária a presença de mulheres negras em todos os cenários sociais: educação, política, nas artes, na televisão, nos brinquedos infantis. Lá na minha infância, eu não tive isso. Cresci ouvindo piadas horrorosas sobre o meu cabelo, na escola, no trabalho, de amigos, de familiares e eu passei a achar que realmente o problema era meu. Onde estavam meus pares? E a pergunta se repetia: Onde estavam os meus?
Durante toda a minha infância, nunca vi uma boneca negra, pois sempre fui acostumada a entender que o negro não era o foco. Não tenho lembranças de propagandas abordando especificamente sobre os cabelos das pessoas negras. Não havia apresentadoras de programas infantis negras. As paquitas não eram negras. Nas novelas, as mulheres negras eram sempre as empregadas, barraqueiras, sem educação, sem perspectiva social. No cenário policial, lá sim eu via os negros. Assim, o meu olhar cresceu envolto de um ponto de vista negativo sobre os meus.
A única lembrança de representatividade que tenho é da jornalista Glória Maria. E foi por causa dela que eu quis ser jornalista. Olhava para ela, em minha televisão, ainda em preto e branco, e dizia: Eu quero ser como ela! Ali, sem saber, eu já estava executando a importância da representatividade: se reconhecer no outro. Ver sua identidade racial nos espaços sociais. Mais uma vez: é ver normalizado as mulheres negras em destaque em todas as áreas possíveis: ciências, nas músicas e até em reality shows.
A representatividade é saber que tem outros vários de nós por aí buscando seu espaço como forma de uma inserção social forçada, já que as portas não foram abertas gentilmente para nós.
Representatividade é encontrar inúmeras alunas negras e elas me darem sorrisos todas as vezes que me veem com os cabelos soltos. Representatividade é andar pelas ruas de Londrina com meu turbante e ver outra mulher negra me olhando e, talvez, pensando: “posso fazer também”.
Representatividade é permitir que os negros circulem em qualquer lugar e que outros negros nos vejam ali. É preciso deixar que nos vejam!
“O lugar social é um local de potência”. Essa frase tem uma relação profunda com a representação. O lugar social que sempre foi dado à mulher negra é o local da subalternidade, ou seja, da inferioridade, da subordinação, da inviabilização, da não associação ao belo. É desse ponto que surgem os estereótipos da mulher negra, assunto da coluna da semana passada. Mas não posso ser injusta: houve alguns pequenos avanços envolvendo a representatividade: está se falando disso com mais frequência na mídia, há mais artistas negros usando sua fama para tal abordagem, há mulheres negras na política tocando nessa temática. Mas, precisa-se muito mais! Então, que os avanços continuem e que o povo negro ocupe, cada vez mais, novos e importantes espaços.
Axé!
Quem é Viviane Alexandrino

Sou a Viviane, tenho 36 anos e atuo como professora de Língua Portuguesa em colégios da cidade de Londrina. Além da formação em Letras Português, pela UEL, e mestranda em Estudos Literários pela referida instituição, sou formada também em Jornalismo, profissão essa que exerci durante 10 anos antes de me apaixonar pela educação.
Foto: PNW Production no Pexels