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E esse seu privilégio aí, hein?

Explicar para pessoas brancas o que é o chamado privilégio branco é algo essencial, mas também extremamente desgastante

Por Viviane Alexandrino

Gosto de partir de vivências pessoais para explicar como é ser mulher negra no Brasil. Nesta semana, eu precisei contar para o pedreiro que veio à minha casa, para uma manutenção, o quão revoltante foi comprar meu carro, não pelas 60 parcelas que eu terei pela frente (também, né, já que os carros seminovos estão pela hora da misericórdia), mas pelo tratamento medonho que eu recebi em algumas concessionárias, uma vez que é bem mais fácil julgar que eu era uma pobre coitada e não uma compradora em potencial.

E foi nesse ponto que eu expliquei a ele, didaticamente, a maneira do racismo se manifestar e que ter uma pele clara é um privilégio explícito. Ele ficou horrorizado! E era exatamente isso que queria: provocar o horror, para depois a reflexão. Porém, em nosso país, há uma negação absoluta de que brancos sejam privilegiados. E quando eu digo privilégio, estou me referindo a situações banais do nosso dia a dia, como, por exemplo, uma simples ida ao supermercado.

Com isso, deixarei alguns exemplos, abaixo, de situações vivenciadas. Se você nunca nem pensou em passar por isso, desculpe-me, você está sendo privilegiado pela cor de sua pele.

SER SEGUIDO INSISTENTEMENTE EM LOJAS

Essa situação é recorrente. Muitas vezes, ao entrar em um comércio, eu percebo olhares, passadas insistentes por você, por exemplo. Uma amiga, branca, estando comigo um dia em uma loja, percebeu e ficou incomodada. Daí, expliquei a ela que ser negra, no Brasil, rotula-me como uma criminosa em potencial.

“VOCÊ NÃO TEM PERFIL PARA A VAGA”

Já escutei isso em vários processos seletivos importantes. E quando me falavam, acreditava que minha trajetória profissional não era suficiente para as atribuições do cargo. Até que um dia eu disputei uma vaga, com uma mulher branca, em que preenchia todos os requisitos, inclusive com a experiência específica solicitada, e não fui contratada com a justificativa de não ter perfil. Pronto, era o racismo se manifestando. E não adianta me chamar de vitimista, não: quando você é negro e percebe que a sociedade tem entranhada falas e pensamentos racistas, você para e analisa melhor. E, claro, estuda-se para isso. Aqui, não foi tirada informação do WhatsApp, por exemplo. É uma construção de conhecimentos, leituras, debates, participação em eventos, trocas com outras pessoas negras.

“ARRUME SEU CABELO”

O cabelo da pessoa negra é “um problema” para a sociedade, que não entende a variedade capilar do nosso país. Logo, estipula-se o que é considerado arrumado, bonito e macio. E o cabelo black é, constantemente, taxado de feio e desarrumado, precisando se adequar para ser aceito. Seu cabelo liso já foi ponto de discussão em uma contratação? Pense, aí!

IR AO MERCADO E GUARDAR A NOTA FISCAL

Se tem uma coisa que toda pessoa negra aprende, desde cedo, é guardar suas notas fiscais, quando realizar suas compras. Afinal, a qualquer hora é hora de ser abordado e ter que provar que as compras são suas e pagas por você. Faço isso até hoje, porque o constrangimento é grande.

SE POSICIONAR E SER TAXADO DE AGRESSIVO

O negro bom é aquele que ouve calado e não se posiciona. Não foi isso que viralizou outro dia na rede social? Um senhor gritava que os negros, hoje, estão chatos, inconvenientes, só porque estamos nos posicionando, ou seja, ficar calado é o que se espera. Enquanto que a pessoa branca ao falar é dita como um sujeito crítico, bem-informada e colaborando para as discussões do seu tempo. Já para a pessoa negra resta o estereótipo de vitimista, agressiva, chata e reclamona.

TER BENS MATERIAIS SEM ACHAREM QUE ESTOU ROUBANDO OU ME PROSTITUINDO

Eu passei por isso em 2021. Foi trocar de carro e umas pessoas sem noção de vida questionaram “O que você está fazendo? ”. Ou seja, se o negro melhora de vida, logo vão achar um jeito para descredibilizar a situação, taxando que fizemos coisas ilícitas para adquirir bens materiais.

Então, pensem. E se você adota tais posturas ou comentários, ainda dá tempo para pensar a respeito e mudar. Vejo vocês na próxima coluna. Axé!

Quem é Viviane Alexandrino

Sou a Viviane, tenho 36 anos e atuo como professora de Língua Portuguesa em colégios da cidade de Londrina. Além da formação em Letras Português, pela UEL, e mestranda em Estudos Literários pela referida instituição, sou formada também em Jornalismo, profissão essa que exerci durante 10 anos antes de me apaixonar pela educação.

Foto: Pexels

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