Por Ana Paula Barcellos
Já faz tempo que não falo sobre notícias e colunas babadeiras da Vogue, mais tempo ainda que não faço coluna com giro fashion. A verdade é que já tem um tempo que as pautas das revistas de Moda, em geral, têm estado bastante fraquinhas ou desinteressantes. Mas essa semana a Vogue Brasil publicou um artigo muito interessante escrito pela Luiza Brasil e que fala de uma trend babadeira que, na verdade, é muito mais que uma tendência.

O artigo em questão fala da nova febre western (e o estilo cowboy) que assola o mundo pop musical e o próprio mundo da Moda e, mais especificamente, sobre as raízes raciais do Velho Oeste estadunidense. Logo no começo, a autora propõe o exercício de imaginar esse lugar e essa cultura conforme eles sempre foram nos apresentado pelos filmes, livros, gibis etc. E não precisa nem fechar os olhos para imaginar de cara um homem branco de olhos claros, né?
Luiza Brasil nos lembra de que esse estereótipo, que busca dialogar com o estadunidense médio, ignora completamente a existência de homens negros e dos povos originários, também como trabalhadores. E os Estados Unidos têm um histórico enorme e vergonhoso de segregação racial e de apagamento, tanto de pessoas negras como de pessoas indígenas de sua História, como se elas não fossem dignas de serem chamadas de “americanas” e de contar como parte de seu povo.

Então quando uma mulher negra e poderosa, como Beyoncè, aparece na edição do Grammy 2024 vestindo peças no estilo western saídas da recém apresentada coleção Outono/Inverno da Louis Vuitton, ela não apenas causa frisson como passa uma mensagem importante: o country é muito mais do que tendência, mais uma vez; ele e todo seu simbolismo estão sendo re-apropriados por pessoas que durante muito tempo foram renegadas, reivindicando aquele que é seu lugar por direito.

Outras faces da trend Western: inclusão x exploração
É claro, há sempre dois lados nessa moeda de troca que é o próprio Capitalismo e nem tudo são flores: no caso dos modelos criados pela grife para seu desfile na temporada de Paris, por exemplo, os acessórios e detalhes de várias das peças apresentadas foram confeccionados em parceria com nativos estadunidenses dos grupos indígenas Dakota (Sioux).
Se, por um lado, esse envolvimento é positivo por ser inclusivo e colocar esses povos na cadeia criativa de elementos que normalmente são apropriados por não-nativos, por outro lado traz a discussão sobre os lucros exorbitantes que as grandes marcas de luxo obtém com o legado desses povos. Essa moeda de troca nunca é justa.

Ainda assim, o debate está lançado. Importante lembrar também que o atual diretor criativo da Louis Vuitton é Pharrel Williams, cantor, compositor e rapper que, assim como Beyoncè, sabe do poder e influência que possui para promover movimentos culturais que sejam também sociais e que causem rupturas no modelo vigente. Ambos assumem um protagonismo também histórico, que desafia o status quo.
E claro, quando o músico estreou no posto de diretor criativo da maison, ouviu inúmeras críticas por não possuir formação em Moda – ele prontamente rebateu dizendo que também não possui formação em Música, ainda assim construiu um incrível legado na área. “Como negros neste planeta, estamos acostumados com isso, nos dizerem o que você pode ou não fazer”, completou.

Pharell Williams e Beyoncè fazem história mais uma vez e, de um jeito simbólico, se unem para participar da criação de um futuro que ajude a ressignificar o passado e contar a História como ela deve ser contada.
Foto Principal: Instagram Beyoncè

Ana Paula Barcellos
Viciada em botas, sacoleira e brecholenta, trabalha com criação de joias artesanais e pesquisa de tendências. Tem foto da Suzy Menkes na estante e escreve essa coluna usando pijama velho, deitada no sofá enquanto toma café com chocolate. Me siga no Instagram Me siga no Instagram @experienciasdecabide e @yopaulab
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