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A dengue, a crise e os caminhos para superar doenças negligenciadas

Por Márcia Huçulak

A covid-19 deixou um rastro de mais de 7 milhões de mortos, afetando de maneira drástica todo o planeta.

O fato de ser uma pandemia grave fez com que houvesse esforços concentrados dos principais países do mundo, com seus amplos recursos financeiros e avançados centros de pesquisa e desenvolvimento de fármacos.

Com isso, emergiu um feito único, histórico: uma vacina eficiente, viabilizada cerca de um ano após o aparecimento do vírus Sars-Cov2 e a partir da qual a doença foi controlada e as mortes drasticamente reduzidas.

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Agora, vejamos o caso da dengue, com a qual convivemos há 37 anos e que se encontra em período crítico no Brasil.

Só recentemente apareceu a primeira vacina, que ainda é distribuída em escala modesta no setor público para as necessidades impostas pela doença.

Claro, covid e dengue são doenças completamente diferentes. Mas eu quero chamar atenção aqui é para o fato de a dengue ser uma “doença negligenciada” e como isso influencia seu combate.

Trata-se de um termo técnico para definir um grupo de enfermidades que afeta principalmente países pobres ou em desenvolvimento.

Não recebe, portanto, toda a atenção merecida da comunidade internacional, dos governos, das empresas, dos centros de pesquisas. Doenças negligenciadas, no entanto, afetam cerca de 1,7 bilhão de pessoas no mundo, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS).

Além da dengue, fazem parte desse grupo doenças infecciosas e parasitárias, como malária, leishmaniose, Chagas e esquistossomose.

Alguém duvida que se o problema tivesse grande incidência em países como Estados Unidos ou Inglaterra ainda estaríamos capengando no controle da dengue?

Essa doença endêmica está presente em mais de cem países da África, América, Sudeste Asiático, Mediterrâneo Oriental e Pacífico Ocidental. Ou seja, países como México, Colômbia e Peru, para ficarmos apenas na América.

No Brasil, chegamos a 2024 com aumento alarmante no número de casos e em uma situação algo vexatória de ainda termos de travar uma luta inglória contra os criadouros do mosquito Aedes aegypti (que pode ser qualquer coisa que permita o acúmulo e mantenha água parada, por mínimo que seja, como uma tampinha de garrafa).

Agentes de saúde precisam bater de porta em porta para alertar moradores sobre as precauções.

Este tipo de ação é importante, mas não superaremos a dengue sem ações mais robustas – como vacina eficaz e em número suficiente; bloqueadores da transmissão e da reprodução do mosquito; entre outras.

Importante deixar claro que não se trata de menosprezar os esforços feitos pelo Brasil, pelos estados e seus centros de excelência, como a Fiocruz e o Butantan, além das universidades (UFPR incluída) no combate à dengue.

A situação da dengue, no entanto, é emblemática do espectro das doenças negligenciadas.

Os entraves ao combate desse grupo de enfermidades requerem abordagem coordenada, que envolva governos, organizações internacionais, setor privado, instituições de pesquisa, sociedade civil e comunidades afetadas.

Entre as várias ações que precisam ser descortinadas estão as de investir mais em pesquisa e desenvolvimento (P&D). Como atingem mais países e populações de baixa renda, há poucos recursos canalizados para tal fim.

De acordo com o Global Centre Health, os recursos para as doenças negligenciadas representaram apenas 1,7% do total de investimentos em P&D de saúde em 2021.

Entre 2000 e 2018 foram desenvolvidos 45 produtos para doenças negligenciadas, enquanto as doenças em geral tiveram 1.106 – ou seja, apenas 4%.

Este tipo de situação leva à escassez de novas terapias, vacinas e métodos para diagnóstico.

A covid-19 demonstrou claramente que problemas de saúde global não podem ser enfrentados apenas nacionalmente – o que não quer dizer que cada país não tenha de fazer os esforços, investimentos e articulações proporcionais ao tamanho do problema em sua área.

A dengue deveria seguir por esse caminho. Ou ficaremos mais 37 anos caçando mosquito.

Márcia Huçulak

A dengue é emblemática no espectro de doenças negligenciadas. Se tivesse grande incidências em países como Estados Unidos ou Inglaterra, ainda estaríamos capengando no seu controle?
Divulgação/Alep

Como secretária de Saúde de Curitiba (2017/2022), liderou o enfrentamento da pandemia de covid-19 na capital – trabalho reconhecido nacionalmente. Formada em Enfermagem pela PUC-PR, tem mestrado em Planejamento de Saúde pela Universidade de Londres (Inglaterra) e especialização em Saúde Pública pela Fiocruz. Elegeu-se deputada estadual em 2022 pelo PSD, sendo a mulher mais bem votada do estado e a mais votada (entre homens e mulheres) de Curitiba. Encontre a Márcia Huçulak nas redes: site
www.marciahuculak.com.br; Instagram: @marciahuculak; Facebook: Márcia Huculak. Telefone gabinete: (41) 3350-4223.

Foto: Canva

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(*) O conteúdo das colunas não reflete, necessariamente, a opinião do O LONDRINENSE.

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