Por Maurício Chiesa Carvalho
Um dos conceitos mais utilizados no mundo da Gestão da Mudança é o da “Curva da Mudança”. Esse é um entendimento que tem ajudado muita gente a entender o que está acontecendo com ela mesma e o que está acontecendo com os outros.
Neste momento, chegamos na Depressão x Confusão: Dicotômico? Antagônico? Paradoxo? A relação sociedade x saúde x economia x vida x futuro. Todos são importantes.
E esta confusão, se dá, em fato, por não termos em tese, vivenciado algo assim em nenhum momento da história. A comunicação é rápida. News e fakenews são propagadas de maneira surreal em termos de velocidade.
Vivemos uma pandemia, um cenário de guerra, com comércios fechados, ruas vazias e notícias tristes que chegam o tempo todo. Para completar, o convívio social, que é uma forma natural de extravasar e equilibrar as emoções, estava desaconselhado. Num momento desses, nossas defesas psicológicas podem não dar conta de manter o nosso bem-estar.
A ansiedade e a angústia geradas pela crise de COVID-19 se dão por muitas razões. Podemos citar, para exemplificar, a ameaça de redução de salário ou perda de emprego ou mesmo o temor de desenvolver a doença agora ou no futuro. Assim, ao nos projetarmos constantemente numa situação que ainda não existe — e que pode não vir a existir —, desperdiçamos o momento presente. Com isso, perdemos oportunidades de ação concreta e objetiva, no aqui e agora, e nos paralisamos.
Vemos, apenas por esses dois exemplos, que tais apreensões se devem a projeções de uma ameaça que não necessariamente pode se concretizar num futuro mais imediato ou distante.
A curva da mudança é a explicação emocional para o que acontece conosco a cada nova mudança da nossa vida.
Você se sente ansioso, com raiva, quase desistindo, querendo parar a mudança?
Isso são reações normais e esperadas em processos de mudança. A curva foi “descoberta” por Elisabeth Kubler-Ross, autora do livro (On the Death and Dying – Sobre a Morte e o Morrer), uma psiquiatra que estudou as reações emocionais de pacientes com doenças terminais, que passavam pelo luto da própria morte.
A curva da mudança acontece da seguinte maneira:
1 – Ao primeiro sinal de ameaça, mudança ou aprendizagem, a nossa primeira reação emocional é a de Negação. Negar quer dizer reagir de maneira que a mudança não tem haver com você, não esteja acontecendo ou se adeque ao seu cenário. “Nessa fase ouvimos frases como: ‘Isso não vai acontecer’, ‘Eu não tenho tempo para essa besteira’, ‘Eu não preciso disso’“.
2 – A segunda fase de Raiva é caracterizada por emoções e comportamentos que envolvem a culpabilização do outro. Tendemos a agir com raiva de maneira silenciosa ou de maneira mais passional e extrovertida. Pessoas nessa fase utilizam as seguintes frases: “Por que isso agora?”; “Só podia ser coisa daquela pessoa”; “Não aguento mais essas iniciativas”.
3 – A terceira fase de Barganha, muito característica em organizações em que a predominância é de tecnologia, caracteriza-se por comportamento de troca e tentativa de persuasão, com a intenção de adiar a mudança: “Será que podemos postergar essa data?”; “Existe mesmo relevância nesse processo acontecer?”; “Minha área (ou eu) não pode ser tratada como exceção?”.
4 – A fase de Depressão é caracterizada pelo desânimo em relação ao processo. Quando estamos de dieta, essa é a fase que pensamos em desistir porque nunca vamos conseguir emagrecer mesmo. Frases como: “Eu não me importo mais”; “Vou fazer só o que me pedem e fingir que sigo”; “Vou ficar calada nas reuniões”; “Acho besteira tentar mais”.
5 – Enfim, chegamos a fase de Aceitação onde já oscilamos as nossas emoções e, então, começamos a racionalizar e entender a mudança como ela é e tentamos nos adaptar a ela.
Entender a curva é aliviante para todos nós, porque todos passamos por ela. E, não adianta pensarmos que nós vamos direto para a aceitação (frase que escuto 10 das 10 vezes que ensino a curva) porque isso não acontece. Nós passamos por essas emoções mesmo sem perceber e a cada etapa emocional a gente reage. E ao reagir com nosso comportamento, impactamos as outras pessoas e dificultamos ou facilitamos a curva de cada uma.
O que fazer com as emoções e comportamentos dessa curva? Perceba-se!
Olhe o seu comportamento e aceite que você está em negação, raiva, depressão. A curva não é linear, a gente vai e volta nesses estados emocionais até conseguir mudar efetivamente. Ao aceitar o seu estado emocional seja empático consigo mesmo. Pergunte-se se não está com medo de não dar conta, medo do desconhecido ou apenas medo do medo! Converse com alguém sobre isso. Isso já é suficiente para essa reação diminuir a intensidade de tempo!
Não tenha medo de admitir que você passa pela curva. Isso é sabedoria! Entender o seu ciclo de mudança é tão essencial quanto saber os vários caminhos que você tem para chegar em casa. Você precisa saber as rotas para não ficar preso na vizinhança.
Depois que fizer isso, é hora de ajudar as outras pessoas. Comece e olhar a reação das pessoas como forma de reação a mudança ao invés de dizer que estão “resistentes” ou que são “cabeça dura”.
O medo da pandemia e a pandemia do medo: Curva no COVID
Diante do número crescente de mortes mundo afora, a covid-19 causou outra pandemia: a de medo. E não é para menos. O estado afetivo surge sempre que uma situação coloca nossas vidas ou a espécie humana em risco, e nos leva a tomar atitudes para enfrentar o perigo. O medo é bem-vindo num primeiro momento. Ele está em consistência com essa situação nova, que as pessoas identificam como potencialmente ameaçadora.
O medo causado por essa pandemia está nos forçando a ampliar nossa consciência como seres humanos interdependentes, onde a nossa sociedade é tão forte quanto seu elo mais fraco. Nesse momento, o elo mais fraco são as pessoas que ignoram as recomendações de quarentena e distanciamento social. Essa pandemia também é um desafio moral que nos faz refletir sobre como atuamos individualmente em nossa sociedade, de como cuidamos de nossos filhos, como nos preocupamos com as crianças que não possuem família, e como nos posicionamos a respeito da forma que nossos governantes cuidam de nossos idosos.
Consciência de que precisamos aprender a cuidar de nossa saúde todos os dias, principalmente cuidando de nossa imunidade e da imunidade dos mais vulneráveis. Consciência de que precisamos aprender a conviver em sociedade, evitando a contaminação de pessoas próximas.
O problema acontece quando ele é agudo, como o que muitas pessoas tiveram nesse momento. Elas ficam acuadas, desesperadas com a ideia de morrer, de perder familiares e amigos, de ficar sem trabalho e não ter dinheiro para sobreviver. Também temem ficar socialmente isoladas por muito tempo ou contrair o vírus ao se aproximar de alguém. Essas sensações devem ser interpretadas como um sinal de alerta, pois podem criar ou piorar doenças psíquicas.
Um artigo publicado por pesquisadores brasileiros no Revista Brasileira de Psiquiatria —baseado em estudos feitos em tragédias, epidemias e pandemias, inclusive a do novo coronavírus — afirma que quando o medo é crônico ou faz o perigo parecer maior do que de fato é, torna-se nocivo e pode ser o gatilho para o desenvolvimento de problemas de saúde mental. Ele aumenta os níveis de ansiedade e estresse em pessoas saudáveis e intensifica os sintomas das que têm transtornos psiquiátricos pré-existentes.
Ainda segundo o documento, durante epidemias, o número de pessoas que desenvolvem distúrbios psíquicos tende a ser maior do que as que são afetadas pelo processo infeccioso. Ignorar o medo só piora a situação. A melhor forma de lidar com ele é acolhê-lo. O importante é a pessoa não negar que está sentindo ou achar que é normal. Ela deve observar se está entrando em pânico, passando de um estado que seria de um alerta desejável para algo excessivo, que a impede de fazer outras coisas.
Por fim, seremos convidados (e não tem como não aceitar) a viver um #NovoNormal. A aceitação disto é o primeiro passo. Assim, passaremos a explorar condições e possibilidades para vivermos novonormalmente com o Covid19, estando presente.
É importante termos a consciência, sim, de nossas contribuições individuais para os rumos da sociedade, sabendo, ao mesmo tempo, que elas têm suas limitações. Cultivar tal consciência é uma boa estratégia para controlar a ansiedade e o medo do futuro pós-pandemia.
Maurício Chiesa Carvalho
Administrador, Executivo de RH, psicanalista, consultor, docente e escritor. Conselheiro da Academia Europeia de Alta Gestão e um dos RHs mais Admirados do Brasil de 2021. Linkedin mauríciochiesacarvalho
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