Quando eu era pequena, lembro que acordei numa certa madrugada e junto com os meus irmãos, fomos ver o Carnaval na janela do clube de nossa cidade, no interior de São Paulo. Lembro do cheiro de suor que vinha lá de dentro e de ficar encantada com a nuvem de confete e serpentina que pairava no ar. E o que dizer das músicas? No pequeno palco do salão, os Irmãos Brunelli davam show nas marchinhas.
O trio de irmãos era famoso na cidade. Eles eram fabricantes de tacos de madeira e tocavam vários instrumentos, alguns fabricados por eles mesmos. Eram dois irmãos e uma irmã e nos meses que antecediam a festa de Momo, eram horas e horas de ensaio. Eles moravam na esquina do clube e tinham até um palquinho em casa para ensaiar. Então, vê-los em ação numa madrugada quente me marcou pro resto da vida. Só não foi melhor porque a mãe nos viu na janela e colocou a gente pra correr de volta para casa.
Adorava as marchinhas e, naquela época, achava engraçado as letras de duplo sentido. Hoje não mais.
Naquele tempo, quando a energia física era interminável, a gente brincava as matinês e depois ainda pulava a noite toda. Ficávamos praticamente sem dormir, emendando um baile no outro. Para uma cidade em que pouca coisa acontecia, era um período de ouro. Uma animação só.
Nossa turma participava com muito entusiasmo do concurso de fantasias de bloco. Eram dias e dias de muita risada elaborando as roupas. Com poucos recursos, a gente sempre levava o prêmio pelo excesso de imaginação. Coitada das mães que sabiam costurar. Lembro de uma fantasia em especial, a de “Coelhinha da Playboy”, que tinha um pompom enorme feito em lã no traseiro e todo mundo queria passar as mãos e tirar uma lasca. Voltei com metade dele para casa. Foi meu último Carnaval de fato.
Voltei a frequentar os salões somente a trabalho. Sempre no plantão, cobrindo a festa em salões e desfiles de escolas de samba na rua. E olha, vi e ouvi muita história engraçada. Como a de um colega que foi trabalhar no Clube Curitibano e uísque para cá, uísque para lá, a certa altura deixou o equipamento fotográfico do lado e caiu – literalmente – de boca na piscina. E perdeu a dentadura. No outro dia, o clube teve que esvaziar a piscina e devolver a dita cuja para o colega.
Também vivi uma experiência maravilhosa ao sair na escola de samba Mancha Verde, em São Paulo, no bloco dos jornalistas, no Carnaval de 98. Pisar na avenida, com o som da bateria bem pertinho, foi uma experiência inesquecível.
Neste ano, só porque não tem Carnaval, estou com uma vontade louca de brincar. Aposto que quando liberarem vai ter um festival de fantasias baseadas na pandemia. Já vou começar a minha. Na dúvida entre a vacina e o vírus.
Raquel Santana

Já foi jornalista, acha que é fotógrafa, mas nesses tempos de Covid-19 ela só quer sombra e água fresca no aconchego do seu lar. Vendo seriados, óbvio!
Foto: Acervo Pessoal