Raquel Santana (*)
Meu corpo nunca aceitou álcool muito bem e agradeço aos céus por isso porque hoje não sei aonde estaria. E descobri isso muito cedo, aos 15 anos. Movida por uma propaganda de Martini, na época em que tudo podia na televisão, comprei um litro da bebida. E pra sofisticar, um vidro de cerejas ao marasquino em calda. Tomei os drinks (assim no plural), sentada em frente à casa da minha avó, na calorenta Araraquara.
Bebericando devagar, nem percebi o porre chegar. Só me dei conta a hora que me chamaram para dentro de casa e, ao levantar, tudo rodou. Como não queria que ninguém soubesse que tinha bebido além da conta, passei a noite vendo o quarto rodar, caladinha, torcendo para não vomitar. Não foi uma experiência edificante.
Feito isso, peguei desconfiança de álcool e só fui beber novamente quando passei no vestibular para jornalismo na UEL, em 1982, aos 21 anos. Foi um porre homérico, de cachaça. Minha cabeça lateja até hoje quando lembra. E é claro que, vivendo em um meio universitário, o álcool rolava solto nas festas de república. E ao contrário do que muita gente pensa, eu era careta. Mal tinha grana para comer, não ia gastar com bebidas. Mas conheço gente que chegou a penhorar a carteira de identidade no boteco várias vezes, porque não tinha controle e nem dinheiro para pagar a conta.
Hoje em dia sou super fresca com álcool. Gosto apenas de algumas bebidas, entre elas vinho e champanhe. Esta última só se for de uvas rosé ou moscatel. Senão é dor de cabeça na certa. E a gente descobre do pior jeito, ou seja, bebendo. Mas o mais engraçado é que mesmo alcoolizada, nunca perdi o controle das coisas.
Sempre brinco que gostaria de ser daquelas pessoas que entornam todas e depois dançam em cima do balcão do bar, feito nos filmes americanos. Mas o máximo de espetáculo que eu proporcionaria seria um jato de vômito na plateia. Bebo, passo mal, meu corpo expulsa o que tiver dentro dele. E é claro que já dei vários desses espetáculos em público nas vezes que ousei beber além da conta. Também já conheci gente que fazia qualquer coisa por uma garrafa de cachaça. Se fosse possível vendia até a mãe.
E por falar em mãe, la pelos idos dos anos 80, a minha se aposentou. Ela trabalhou 35 anos num centro de saúde. Como morávamos numa cidade pequena, ela decidiu que, depois de pendurar as chuteiras, queria morar num centro maior. Desde que entrei na faculdade, ela sempre foi presente na Casa Verde. Falante e descolada como boa aquariana, conquistou minha turma inteira logo de cara. Como sempre tive um bom relacionamento com ela, não quis deixá-la sozinha. E lá foi dona Therezinha morar em Londrina.
É claro que ia dar B.O. Por mais liberal que fosse, mãe é mãe. O ápice foi o stress causado por uma garrafa de vinho português que ela ganhou e dois amigos, na calada da noite, surrupiaram dela. Guardou mágoa dos dois enquanto viveu. Também foi esse amigo que protagonizou o maior mico alcoólico que já tive notícia.
Dono de uma loja de roupas numa galeria da cidade, depois de tomar todas entre o Valentino e o Clube da Esquina, ao invés de voltar para casa, ele foi para a loja. Calmamente se despiu – como fazia todas noites – fez xixi, deitou e dormiu. Tudo na vitrine da loja. No outro dia, os lojistas chegaram para trabalhar e se depararam com a cena. Dono de um sono pesado, não houve o que o fizesse acordar. O jeito foi cobrir a vitrine com jornal antes que a notícia fosse ele!
(*) É jornalista radicada em Curitiba mas apaixonada por Londrina