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Estou acumulando raiva e decepções, sem conseguir me impor

Por Telma Elorza

“Tenho 30 anos e já me sinto uma velha cansada. Passei minha vida inteira acumulando raiva e decepções porque não consigo me impor, externar meus sentimentos e me libertar do que me faz mal. Sou a boazinha que todo mundo passa por cima e usa quando precisa de alguma coisa. Como posso mudar tudo isso?”

Ih, amiga, seu problema é complicado, mas muito mais comum que você imagina. Porque é uma questão cultural nessa nossa sociedade machista: a mulher tem que ser meiga, boazinha, cordata e prestativa para ser uma boa filha, boa esposa, boa mãe, boa trabalhadora. Somos criadas para sermos assim, a princesa que nunca ergue a voz, nunca expressa sua opinião, nunca diz NÃO. Martelaram na nossa cabeça, a vida inteira, para não sermos egoístas, pensarmos nos outros primeiro e esquercermos de nós. Pela sociedade, devemos nos preocupar com o bem-estar dos outros e nos colocar em último lugar.

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Enquanto somos meigas e boazinhas, ninguém nos coloca em primeiro lugar, nos dá o valor merecido ou escuta o que temos a dizer. Só que isso tem seu preço e ele é caro: vamos acumulando frustrações, raiva, mágoas até adoecermos. E quando explodimos, somos a “louca”, a que surtou, a que se tornou agressiva sem nenhum aviso.

Eu sei o que digo. Eu era assim, em boa parte da infância e adolescência, uma menina que não dava trabalho, estava pronta a ajudar os outros e esquecer de mim. Fui ensinada por uma família católica praticante que egoísmo era algo feio, um pecado até (aliás, se você pegar a definição de egoísmo, feita por homens, em sua maioria, vai ver que é extremamente negativa para as mulheres que tentam se valorizar perante os outros).

E eu achava que, se não deixasse que as pessoas se aproveitarem de mim, se não demonstrasse minha bondade – até por aqueles que, obviamente, só me procuravam quando precisavam de mim -, estava sendo egoísta. Até que, num episódio traumático, percebi que, se não mudasse, se não deixasse se ser quem esperavam que eu fosse e me tornasse eu mesma, iria passar a minha vida me reprimindo e sofrendo. Não foi fácil, não foi de repente – na verdade levou muitos anos para me livrar de toda aquela “programação” de mulher boazinha -, mas mudei.

Acumular raiva e decepções faz mal

Hoje, me coloco em primeiro lugar, inclusive perante a minha família e amigos próximos. Avalio sempre quando e como ajudar os outros vai me prejudicar, física e emocionalmente. Porque, se não estamos bem conosco mesmo, não temos nem como ajudar quando realmente precisarem de nós. Isso é ser egoísta? Não. É uma questão de sobrevivência, de saúde mental. Acumular raiva e decepções faz mal.

Aprendi a falar NÃO. O NÃO é extremamente necessário nas nossas vidas. NÃO quero, NÃO vou fazer. NÃO, obrigada.

E aprendi também a falar tudo o que estou pensando sobre situações que não me agradam. Analiso e observo e me afasto. Mas se sou cobrada a dar uma posição, exponho sem medo o que penso. Doa a quem doer.

Virei a grossa? Virei. Virei aquela sem papas na língua? Virei também. Mas não engulo mais calada toda a merda que tentam despejar sobre mim. Me julgam? Deixe que me julguem. Os que valem a pena continuam do meu lado, me entendem e aprenderam a conviver com essa mulher forte que me tornei. Os outros? Ninguém vem aqui em casa pagar meus boletos, me dar suporte nas minhas necessidades emocionais, ver se estou precisando de ajuda. Então, os outros – principalmente os aproveitadores da bondade alheia – que se fodam.

Assim, amiga, eu sugiro que você descubra o seu lado forte também, para sua própria saúde.

Talvez precise de ajuda profissional, porque o processo não é fácil, não é simples. Talvez buscar um psicólogo ou psicanalista para compreender quem você é realmente. Mas sufiro que vá logo buscar essa ajuda, antes que aconteça algo com você.

Espero que tenha ajudado.

Se tiver dúvidas sobre relacionamentos, me mande um e-mail no telma@olondrinense.com.br

Quem é a Tia Telma

Telma Elorza é jornalista, divorciada e adora dar pitaco na vida dos outros. Mas sempre com autorização.

Arte: Mirella Fontana

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(*) O conteúdo das colunas não reflete, necessariamente, a opinião do O LONDRINENSE.

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