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Dúvida, desconfiança e desconstrução: o óbvio esconde a verdade

“O óbvio é a verdade mais difícil de se enxergar”, diz Clarice Lispector (1920-1977), escritora e jornalista ucraniana naturalizada brasileira. É dela a frase que nos dá o pontapé para nossas reflexões filosóficas. Desta vez, sobre aquilo que é – ou parece ser – óbvio. É a verdade? Ou esconde a verdade? É por esses caminhos investigativos que vamos filosofar nesta coluna de hoje.

O que é óbvio é algo reconfortante. Acalma nossas inquietudes humanas e nos dá uma sensação de alívio e satisfação, simplesmente porque nos fornece uma resposta às nossas dúvidas. Que, infelizmente, nem sempre correspondem à verdade dos fatos. E que pode estar completamente distante da realidade. Embora nos pareça muito verossímil.

Lembre-se que durante muito tempo – e isso tem culpa da filosofia, de certa forma – as pessoas acreditaram que a Terra era o centro do universo. Defenderam isso de forma filosófica, científica e até religiosa. E isso era óbvio. Sempre fora assim. E durante muito tempo permaneceu assim (cerca de dois milênios). Até que, de repente, o óbvio começou a ser questionado.

O que a gente chama na filosofia de desconstrução. Alguém duvidou, alguém questionou, alguém resolveu investigar. E dois milênios depois já existiam equipamentos capazes de observar esse universo, literalmente, coisa que não havia quando os primeiros filósofos criaram as primeiras teorias sobre as galáxias. Da mesma forma acontece com tudo o que é óbvio neste mundo.

Uma atitude filosófica é a de desconfiar. E de questionar. Vivemos tempos sombrios, de modo particular no Brasil político de 2019. Tempos em que questionar e duvidar passou a ser significado de torcer contra ou de ser “esquerdista” ou “petista”, palavras que pejorativamente se transformaram em xingamentos. Estamos caminhando por caminhos tortuosos. Mas, devemos manter os passos para frente.

Até porque o óbvio pode se transformar num grande e temível obstáculo, num irreversível entrave. Nós não queremos isso. Portanto, precisamos sempre desconfiar, questionar, desconstruir. Isso tudo é racionalidade. Tal qual diria o pai do racionalismo moderno, o filósofo francês René Descartes: duvidar de tudo o que é possível duvidar (do corpo, das pessoas, de Deus, de si mesmos, do mundo) até chegar um momento em que se encontra a verdade.

Por isso, a certeza de que pensamos – e de que, assim, podemos duvidar de tudo: cogito ergo sim (penso, logo existo). A dúvida, o questionamento e as desconfianças são a base da razão e da verdade. Não tem nada demais nisso. Ao contrário, são atitudes que devem ser estimuladas. Aliás, eu desafio você, leitor, a exercitar a dúvida, diariamente.

Foto: Pixabay

Fábio Luporini

Sou jornalista formado pela  Universidade Norte do Paraná e sociólogo formado pela Universidade Estadual de Londrina (UEL) . Fui repórter, editor e chefe de redação no extinto Jornal de Londrina (JL), atuei como produtor na RPC (afiliada da TV Globo), fundei o também extinto Portal Duo e trabalho como assessor de imprensa e professor de Filosofia, Sociologia, História, Redação e Geopolítica, em Londrina.

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