Anos atrás participei de uma expô chamada “Vivercidades, ventos e tempestades”, na antiga e extinta Galeria de Arte do Banestado. Foi uma coletiva (vários artistas, com obras diferentes) e foi a primeira vez que usei nossa terra como elemento pictórico (ou como elemento na pintura).
Para quem não sabe, nossa terra serve muito bem para isso, afinal não éà toa que nos chamam de “pé vermelho”… A terra daqui, para mim, é muito mais que só matéria, é também cheia de símbolos, significados, suor e sangue de quem viveu e vive nessa cidade cheia de desafios!

Inverno aqui é praticamente uma pintura! Céu muito azul como de Magritte, terra vermelha e muito verde! E estradas cheias de paisagens sinuosas, com plantações verdíssimas… E cheiro de flor no ar!
O que me leva para outros tempos, quando eu era mais iniciante que qualquer coisa e tinha o hábito de pintar de madrugada…encapotada, a garrafa cheia de café, e o meu quarto ou a copa da minha casa viravam atelier! Eu pintava muito, e o trabalho rendia! Produzir de madrugada é completamente diferente de qualquer outro momento do dia! Existe um certo silêncio das madrugadas, quebrado de vez em quando pelo pio de corujas que sempre moraram por aqui, ou algum carro passando na via expressa…O ar fica mais limpo, mais melancólico e mais introspectivo.

Madrugadas são ótimas quando temos aquele tipo de insônia em que a mente e o corpo concordam em trabalhar juntos (tem insônias que são irritantes!). Geralmente, os artistas mais prolíficos tem horários fixos de trabalho e criam uma rotina para isso… Até esse momento tenho contado histórias de vários artistas (essse ano especificamente de artistas mulheres), podem ter certeza que todas tinham seus rituais e rotinas para o trabalho e era assim todos os dias! Lembro de ver uma reportagem da Tomie Ohtake, em que falavam dos horários que ela trabalhava, sem falhar um dia sequer (e ainda acham que artistas não trabalham!).

Infelizmente, com o tempo e com o atelier fora de casa, perdi muito essa rotina de trabalhar de madrugada. Diga-se de passagem que, depois dos quarenta, o corpo muitas vezes não aguenta atravessar madrugadas regadas a café e cheiro de tinta! Sou capaz de apostar que muitos artistas concordariam comigo!

Com essa loucura toda de pandemia e confusão de horários, as madrugadas são uma ótima pedida pra trabalhos de criação. Não consigo imaginar o que seria da vida sem a arte e mesmo com todos os problemas que temos por aqui, também não consigo imaginar como seria meu trabalho, sem as cores dessa cidade, elas entram pelos poros!
Boa semana e, na coluna próxima, continuamos com as mulheres sensacionais e marcantes!
Usem mascaras e tomem a vacina quando chegar a vez!
Angela Diana

Sou londrinense e me dedico à arte desde 1986 quando pisei pela primeira vez no atelier de Leticia Marquez. Fui co-fundadora da Oficina de Arte, em parceria com Mira Benvenuto e atuo nas áreas de pintura, escultura, desenho e orientação de artes para adolescentes e adultos.
Foto: Acervo pessoal