Município pode deixar de receber verbas federais se não resolver déficit da Caapsml

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Certificado está sob judice e uma ação no TCE-PR está investigando a falta de repasses da Prefeitura a autarquia

Telma Elorza

O LONDRINENSE

Londrina corre o risco de perder o direito de receber todos os tipos de verbas federais – inclusive Saúde, Educação, emendas parlamentares e outras – se não der uma solução urgente para o déficit financeiro e atuarial da Caixa de Assistência, Aposentadoria e Pensões dos Servidores do Município de Londrina (Caapsml). O Certificado de Regularidade Previdenciária (CRP) do Município está sob judicie e pode ser cancelado a qualquer momento. O último, expedido em 07 de julho de 2020, deixa claro que o Município está em situação irregular e que só foi expedido por determinação judicial.

Além disso, uma ação de Tomada de Contas Extraordinárias corre no Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), investigando o fato da Prefeitura não ter feito os repasses programados na Lei Orçamentaria Anual (LOA) de 2018 e 2019 – de R$71 milhões e R$ 46,794 milhões, respectivamente-, inclusive cuja previsão de receita estava baseada no dinheiro arrecadado com o aumento no valor do IPTU. O relator é o conselheiro Ivan Lelis Bonilha e o número do processo é 744420/19.

Quem faz as denúncias é a presidente do Conselho Administrativo da Caapsml, Rosângela Maria Cebulski. Segundo ela, em 2020, o órgão tem em caixa R$40 milhões, com uma folha de pagamento mensal estimada em R$27,7 milhões para servidores inativos e pensionistas e arrecadação mensal de R$25,2 milhões, com um déficit mensal de R$2,5 milhões.

“Se não houver uma recomposição do fundo previdenciário e logo, vai chegar o ponto em que não teremos dinheiro para os compromissos. Por lei, os inativos têm prioridade em receber seus proventos. Eles estão garantidos. Mas esse dinheiro vai sair de onde? Da folha de pagamento dos ativos, da Saúde, da Educação?”, questiona. Ela lembra que, se a Prefeitura for obrigada a pagar os benefícios com dinheiro do orçamento, os inativos passam a constar como gasto de pessoal, ultrapassando os limites estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

De acordo com Rosângela, a denúncia feita ao TCE aponta a responsabilidade da Prefeitura – e seus representantes – ao deixarem de cumprir o estabelecido. “Depois a lei foi mudada, aumentando o percentual da contribuição previdenciária dos servidores ativos e inativos. No entanto, os compromissos na sua vigência não foram cumpridos”, diz.

Na ação no TCE, o Conselho Administrativo diz que “Indiferente a todos os alertas emitidos por todos os técnicos e atuários, o Prefeito do Município insiste em ignorar a situação caótica que se aproxima e que trará problemas de toda ordem às finanças municipais. O prazo para a tomada de ações preventivas já se exauriu e a cada dia que passa a situação só se agrava”. E aponta, por parte da atual administração: “O descumprimento da Lei 12.481/2016, o descumprimento da Lei Orçamentárias do exercício de 2018 — Lei 12.646/2016, o descumprimento da Lei Orçamentária do exercício de 2019 -Lei 12.805/2018, o descumprimento da Lei 12.900/2020 – LDO/2020 e, consequentemente da Lei de Responsabilidade Fiscal — Lei Complementar n° 102/2000 trarão consequências às finanças públicas municipais que afetarão de forma significativa o Município de Londrina”.

Segundo a assessoria de imprensa do TCE-PR, o processo está em fase de contraditório. Após essa fase, o relator verificará a necessidade de alguma nova diligência para, posteriormente, encaminhar os autos para instrução da unidade técnica do TCE-PR e manifestação do Ministério Público de Contas. Depois disso, os autos voltam para o relator, que irá fazer sua proposta de voto e incluir o processo na pauta de julgamentos do Tribunal, para que seja tomada uma decisão de mérito.

Entenda o caso

Em 2016, o fundo de previdência da Caapsml – que recebia recursos de servidores contratados depois de 2003 – foi unido ao fundo financeiro que pagava benefícios aos servidores aposentados, que tinha pouco dinheiro em caixa. Veja a a tabela abaixo.

Fonte: Conselho Administrativo da Caapsml

Segundo a presidente do Conselho, é importante destacar que já na administração anterior, também nada foi feito para o equacionamento do déficit financeiro e atuarial do Regime Próprio de Previdência Social do Servidor Público (RPPS). “No fim do ano de 2016, a equipe de transição do atual prefeito, juntamente com o Sindserv e Conselho da Caapsml, definiram definiram pela junção das massas para que, a partir de janeiro de 2017, os recursos do Fundo Previdência fosse utilizado para pagamento dos aposentados e pensionistas. Conforme foi definido também nessa reunião, o executivo teria que encaminhar à Câmara, para o exercício financeiro de plano de amortização do déficit atuarial do Fundo de Previdência, nos termos do artigo 19 da Portaria nº 403/2008 do Ministério da Previdência Social. Isso deveria começar a acontecer em fevereiro de 2018. Mas nunca foi cumprido. Depois de quatro anos, o fundo previdenciário também foi descapitalizado como ocorreu com o fundo financeiro, em 2016”, explica.

Rosângela diz que o executivo, não tendo mais recursos para realizar a complementação da folha no ano de 2021, apresentou na LOA de 2021 a alienação dos três terrenos da RPPS no valor de R$ 8 milhões e a suspensão da taxa administrativa que é repassada ao órgão gerenciador da autarquia para pagamento de despesas correntes – folha de servidores, manutenção predial e equipamento, além de material de consumo. “Além de descapitalizar o fundo previdenciário, agora quer descapitalizar o órgão gerenciador não fazendo esse repasse”.

No decorrer dos anos, o Conselho apresentou várias propostas para resolver o problema, mas nenhum foi aceita pela administração. Entre as sugestões, estão utilização dos recursos do pré-sal, aproximadamente R$ 4 milhões; a utilização do dinheiro arrecadado pela venda da folha de pagamento da Prefeitura ao Itaú, em aproximadamente R$52 milhões; e a reversão do imposto de renda dos aposentados e pensionistas, no valor de cerca de R$36 milhões anuais. “Esses recursos ficam no Município e é computado como recursos livres”, aponta Rosângela.

Déficit atuarial

O superintendente da Caapml, Marco Antônio Bacarin, diz que a venda dos terrenos é necessária, porque a prefeitura já avisou que só vai repassar R$30 milhões para o ano que vem. “Cortamos todas as despesas de 2021 – que estavam previstas em R$86 milhões – que podíamos, fizemos uma economia de R$15 milhões. O restante, R$41 milhões, teremos que dar um jeito de arrumar”, explica. Segundo ele, os terrenos não estão compensando ficar subutilizados. “Dois estão alugados por cerca de R$2 mil e um nem alugar conseguimos”, diz.

Do fundo previdenciário, só serão possíveis utilizar R$20 milhões, porque estão imobilizados em ações. “Temos mais R$8 milhões em fundos imobiliários que podemos resgatar. O restante, o resgate só é possível em 2022. Não temos mais de onde tirar”, afirma. Para fechar a conta, Bacarin diz que terão que usar o dinheiro do órgão gerenciador, que soma atualmente R$10 milhões. “Temos despesa anual de R$5 milhões, os outros R$5 milhões entrarão na conta para fechar os R$71 milhões necessários do orçamento”, explica. O órgão, no entanto, ficará totalmente descapitalizado, sem sobras para emergências. Segundo ele, no entanto, isso resolve o problema de 2021. “Em 2022 é outra história”.

Em 2022, a Caapsml não terá mais que R$20 milhões no fundo, não terá imóveis e não terá de onde tirar dinheiro. Talvez nem o CRP por causa do déficit atuarial. Segundo Bacarin, o déficit atuarial é o valor que a autarquia precisaria de dinheiro em investimentos para que seja possível cumprir as obrigações assumidas com os beneficiários, hoje estimado em aproximadamente R$ 3 bilhões. “Mas nós temos 35 anos para ir pagando. Você não precisa desse dinheiro hoje”, diz.

Segundo ele, a prefeitura precisa estabelecer uma conta e definir quanto vai pagar por ano – aprovado por lei e cumprida – para que esse déficit atuarial seja cumprido. “Arredondando, mais ou menos, a prefeitura precisaria depositar em torno de R$10 milhões/mês, R$120 milhões ano durante 35 anos”, explica. Isso, segundo ele, tem que começar a ser feito logo porque, a partir de 20202, será uma exigência instransponível. “E os juros seriam mais altos que os depósitos mensais”, afirma.

Bacarin diz que há estudos sendo feitos, inclusive mudanças na previdência do servidores, como foi feito na previdência social, para minimizar os déficits e de como arrecadar mais dinheiro para que a Caapsml saia da condição de deficitária. Uma das soluções estudadas é aumentar a alíquota do ITBI (Imposto de Transmissão de Imóveis) de 2% para 3%. “E o dinheiro viria tudo para a Caapsml”, diz.

Outra solução estudada é transformar a área da cabeceira do aeroporto, que será privatizado em março do ano que vem, em área para empresas se instalarem. “Aí os terrenos não seriam doados, mas alugados. E o royalties viriam para o fundo, como acontece com Joinville, que tem uma previdência superavitária”, diz. Um decreto tornando aquela área de utilidade pública já teria sido preparado.

Além disso, o superintendente diz que há um projeto de lei sendo preparado para a construção de um prédio numa área ao lado da prefeitura – chamado de Anexo B – que prevê que uma construtora edifique sem custos para prefeitura, em troca de outro terreno público. “Aí esse prédio seria repassado a Caapsml que alugaria o espaço para secretarias que estão fora do prédio principal. São gastos cerca de R$12 milhões ano com alugueis. Por que não vir esse dinheiro para RPPS?”, diz.

Foto: Arquivo/Caapsml

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