O Plenário entendeu que a produção, a comercialização e o consumo de sibutramina, anfepramona, femproporex e mazindol não dispensam o prévio registro sanitário
O LONDRINENSE com assessoria
O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucional a Lei 13.454/2017, que autorizava a produção, a comercialização e o consumo dos inibidores de apetite sibutramina, anfepramona, femproporex e mazindol. Para a maioria do colegiado, a norma, ao contrariar recomendação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e autorizar a produção das substâncias, não protege de maneira eficiente o direito à saúde e ofende o princípio da proibição do retrocesso social, que impossibilita a adoção de medidas que visem revogar direitos sociais já consagrados na ordem jurídica.
Proibição
Na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5779, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS) sustentava que a lei fora editada sem prévia motivação e justificação administrativa plausível ou interesse público relevante, contrariando a Anvisa, que, como órgão fiscalizador da eficácia e da segurança dos remédios para emagrecer, recomenda sua proibição no país, em razão de seus graves efeitos adversos.
Julgamento
O julgamento foi iniciado na quarta-feira (13), com três votos para declarar a constitucionalidade da lei – ministros Nunes Marques (relator), Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso – e um contra a sua validade – ministro Edson Fachin.
Em seu voto, que prevaleceu no julgamento, Fachin considerou inconstitucional a lei e, como consequência, a produção, a comercialização e o consumo desses anorexígenos não dispensam o prévio registro sanitário nem as demais ações de vigilância sanitária da Anvisa, “a quem cabe avaliar e decidir em cada caso à luz dos estudos científicos e da proteção à saúde”.
Proteção insuficiente
Na sessão de hoje, a ministra Cármen Lúcia se associou à divergência aberta ontem pelo ministro Edson Fachin. A seu ver, não se pode considerar válida uma lei que ponha em perigo a saúde, por inobservância dos princípios da prevenção e da precaução. No caso, ela considerou que a norma deixa insuficiente a proteção à saúde e, portanto, não é compatível com a Constituição Federal.
Retrocesso
No mesmo sentido, o ministro Ricardo Lewandowski assinalou que a Anvisa tem o dever de editar atos normativos que visam à proteção da saúde e não podem ser revogados por lei sem se garanta igual proteção à saúde da população, sob pena de infringência ao princípio da proibição do retrocesso. Para ele, o Congresso Nacional extrapolou seu dever de editar leis com caráter abstrato e decidiu regular o tema atuando no caso concreto. O ministro citou precedente em que o Supremo assentou que o Congresso não pode autorizar a distribuição de medicamentos sem controle prévio de viabilidade sanitária (ADI 5501).
Autonomia funcional
Ao se associar à corrente divergente, o ministro Gilmar Mendes afirmou que a manutenção da lei questionada pode estimular a edição de leis semelhantes descredenciando normas das agências reguladoras. “A lei provoca o curioso efeito de tornar indisponível a realização de qualquer juízo técnico acerca do registro das substâncias em referência”, afirmou. Na prática, a seu ver, ela bloqueia a própria autonomia funcional da agência.
Agências estrangeiras
O ministro destacou, ainda, que, na época da edição da lei, três das quatro substâncias eram unanimemente proibidas nos Estados Unidos, na União Europeia, no Canadá, na Suíça e em Singapura. Em 2021, segundo informações apresentadas por ele, a proibição permanece.
A ministra Rosa Weber e os ministros Dias Toffoli e Luiz Fux votaram no mesmo sentido.
Anvisa
A Anvisa publicou, em seu site, um manifesto para exaltar a decisão do STF. Leia:
“A Anvisa vem manifestar publicamente o alcance e a importância da decisão do STF, que reconheceu a necessidade de atuação do regulador sanitário e ponderou sobre os riscos associados à autorização de produtos sem o devido registro sanitário, valorando o dever das instituições de zelar pela proteção à saúde.
Esses medicamentos haviam sido proibidos pela Anvisa ainda em 2011, diante das evidências científicas disponíveis. Para a Agência, a decisão é um reconhecimento da sua competência técnica e legal sobre a avaliação da relação de risco-benefício de medicamentos utilizados no Brasil.
A Anvisa vai tomar conhecimento do inteiro teor da decisão a partir de sua publicação para avaliar a repercussão do resultado do julgamento e verificar a regulamentação vigente e as adequações necessárias nas normas.
A Agência mantém a posição de que os riscos do uso dos três medicamentos (mazindol, anfepramona e femproporex) superam significativamente os seus benefícios. Dessa forma, deverá dar encaminhamento para retomar a vedação sobre o uso e a comercialização dessas substâncias no país.
Até o momento, não há novos dados ou estudos que indiquem uma situação favorável ao uso desses produtos. Desde a sua proibição pela Anvisa, em 2011, nenhum laboratório apresentou estudos clínicos que indicassem alguma relação favorável no uso da anfepramona, do femproporex e do mazindol.”
Entenda o caso
Em 2011, a Anvisa retirou do mercado as substâncias inibidoras de apetite do tipo anfetamínicos – mazindol, femproporex e anfepramona. Para essa decisão foram analisados mais de 170 trabalhos científicos e realizadas discussões técnicas, inclusive com outras agências regulatórias do mundo, que naquele momento haviam concluído análises semelhantes.
Ficou comprovado que os três medicamentos citados não apresentavam eficácia, com resultados absolutamente insatisfatórios no médio e longo prazo, além de trazerem efeitos colaterais que incluem risco de dependência, aumento da hipertensão arterial e problemas psiquiátricos, bem como outros danos ao cérebro e ao sistema cardiovascular.
A sibutramina também foi reavaliada em 2011, mas, neste caso, ficou demonstrado que o seu benefício era maior que o seu risco, desde que utilizada adequadamente e para determinados perfis de pacientes.
Diante disse, a Anvisa estabeleceu dose máxima diária, limitação no tempo do tratamento, assinatura de Termo de Responsabilidade pelo médico prescritor e Termo de Ciência do paciente para o uso da substância.
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